Adelson Pereira de Sousa
Jefferson Von Randow Rattes Leitão
Michelle Regina Viau
“O futuro do constitucionalismo” diz respeito a tema diverso dentro da
literatura jurídica, dividindo opiniões entre os autores. Alguns negam a
existência deste fenômeno, atribuindo ao futuro do constitucionalismo, no
sentido restrito do termo, apenas uma extensão ou continuidade do
neoconstitucionalismo. Outros, entretanto, afirmam que deve o
constitucionalismo tem um futuro em construção e este futuro esta influenciado
até identificar-se sobremaneira a alguns aspectos, como verdade, solidariedade, consenso, continuidade, participação, integração
e universalidade, alcançando um ponto de equilíbrio com as concepções
extraídas do constitucionalismo contemporâneo.
Sobre o tema destacam-se as ideias de José Roberto
Dromi que prega um equilíbrio entre os atributos do constitucionalismo moderno
e os excessos do constitucionalismo contemporâneo. Da mesma forma se posiciona
Uadi Lammêgo Bulos, “espera-se que a constituição do futuro propicie o ponto de
equilíbrio entre as ideias hauridas do constitucionalismo moderno e os excessos
do constitucionalismo contemporâneo” (2010, p. 62). Em um dizer mais simples,
grosso modo falando, trata-se de mesmo de banir dos textos constitucionais
projetos fantasiosos ou utopias sem fundamento. Uma constituição deve conter as
aspirações presentes de um povo, bem como um caminho a ser percorrido em médio
prazo.
Entretanto, deve-se considerar sempre o grau de
exeqüibilidade desses anseios. Um texto constitucional não pode ser uma mera
carta de intenções, uma vez que boas intenções nem sempre se traduzem em
políticas públicas. É preciso considerar o que é factível e separar de meros
formalismos ou factóides que apenas servem para gerar especulações desprovidas
de realidade e insatisfação no seio da sociedade.
Este ponto já nos remete ao primeiro e, talvez,
mais importante aspecto do constitucionalismo do futuro: a verdade, que deve
ser perseguida sempre pela lei maior, mas deve, primeiramente nela estar
contida. Os valores acima apontados e que marcarão o constitucionalismo do
futuro, sendo a verdade compreendida como a ausência de promessas impossíveis
de serem realizadas nas constituições. Por
verdade, “entende-se a preocupação com a necessidade de promessas factíveis
pelo Constituinte (LAZARI, 2011, p. 99)”. As constituições não consagrarão
promessas impossíveis ou mentiras. Deve-se ponderar o que o Estado realmente
necessita e o que se pode constitucionalizar.
A solidariedade faz com que as constituições do
futuro se aproximem de uma nova ideia de igualdade baseada na solidariedade dos
povos na dignidade da pessoa humana e na justiça social eliminando quaisquer
descriminações. É, por assim dizer, a última etapa do ideário defendido pelos
revolucionários do século das luzes: “liberdade, igualdade e fraternidade”.
Liberdade econômica e política. Igualdade entre os homens, que livres podem
negociar e contratar na condição de pares, de iguais, sem a submissão cega do
cidadão frente a monarquia ou o Estado nascente. Fraternidade, traduzida na
construção de uma sociedade mais humana e solidária, capaz de dividir entre
seus membros os frutos decorrentes dessa liberdade e dessa igualdade.
O consenso relaciona-se, também, à
solidariedade. A elaboração normativa será fruto do consenso democrático. Esse consenso não significa maioria, como
erroneamente se possa pensar, mas “pressupõe a manutenção da
inquebrantabilidade da ordem democrática, com a adesão solidária da parte que
consentiu, consensualmente, em prol de um interesse maior (LAZARI, 2011, p.
101)”. É a buscar de alcançarmos um texto constitucional que tenha as marcas de
deferentes matizes ideológicos e culturais, que só é possível se construído a
partir do consenso.
A continuidade consiste na ponderação e no
equilíbrio das mudanças; dando continuidade no caminho traçado. Impossível
pensar em uma constituição que negue os aspectos históricos de seu tempo, que queira
partir de um marco zero. A constituição não pode ser um divisor de eras, ela
deve muito mais traduzir um tempo de transição e avanços, sem significar
ruptura.
A participação refere-se “à
efetiva participação dos corpos intermediários da sociedade, consagrando-se as
ideias de democracia participativa e de Estado de Direito Democrático (LENZA,
2010, p. 54)”. “O povo será convocado a participar de forma ativa, integral
equilibrada e responsável nos negócios do Estado (BULOS, 2010, p. 62)”. No
Brasil, por exemplo, a Carta Magna vigente é um constante convite ao povo
brasileiro de gerir com as próprias mãos, e a partir de seus anseios legítimos,
a coisa pública. Somente através da participação popular no projeto de
construção de uma nação melhor é que o texto constitucional encontrarar
respaldo e abrigo.
Na participação o povo e os corpos intermediários
da sociedade participarão de forma ativa, integral e equilibrada no processo
político. Haverá integração, prevista nas constituições, mediantes cláusulas
que prevejam órgãos supranacionais, dos planos internos e externos do Estado,
usufruindo a integração espiritual, moral, ética e institucional dos povos.
Quanto à universalização os direitos fundamentais
internacionais previstos nas constituições do futuro, com prevalência universal
dos direitos do homem, sendo eliminadas quaisquer formas de desumanização,
vislumbramos a busca do isolacionismo constitucional, que significa a percepção
de um texto que considere o processo de globalização econômica e cultural que
mergulhamos no século XX. Hoje, nenhuma nação que se pretenda desenvolvida pode
negar os direitos da pessoa humana, a busca incessante por sua dignidade
e as conquistas já consolidadas no tratados e pactos internacionais. Este
espírito nos leva a um caminho, a universalização das constituições. Não se
trata porém de pensarmos a construção de uma constituição uma para todo o
mundo, para todas as nações. Mas sim, de um espírito, de princípios e de
garantias que devem constar em todas as cartas, respeitadas a autonomia e a
soberania de cada nação.
Importante destacar que a jurisprudência pátria já
vem reconhecendo alguns desses valores, como se pode observar do julgamento da
PET 3388/STF e da ADI 3.768/STF.
Da PET 3388, cito trecho do voto do Ministro Carlos
Britto:
Os arts. 231 e 232 da Constituição Federal são de
finalidade nitidamente fraternal ou solidária, própria de uma quadra
constitucional que se volta para a efetivação de um novo tipo de igualdade: a
igualdade civil-moral de minorias, tendo em vista o proto-valor da integração
comunitária. Era constitucional compensatória de desvantagens historicamente
acumuladas, a se viabilizar por mecanismos oficiais de ações afirmativas. No
caso, os índios a desfrutar de um espaço fundiário que lhes assegure meios
dignos de subsistência econômica para mais eficazmente poderem preservar sua
identidade somática, linguística e cultural.
A mencionada ação direta de inconstitucionalidade
(ADI 3.768), a qual tinha por objeto a garantia da gratuidade dos transportes
públicos urbanos e semi-urbanos aos maiores de sessenta e cinco anos de idade,
transcreve-se o voto da relatora Ministra Carmem Lúcia:
Primeiro, porque independentemente da
classificação, como consignado na Constituição, é dever da família, da
sociedade e do Estado assegurar a participação do idoso na comunidade. Segundo,
porque essa participação demanda, salvo em casos específicos, a possibilidade
de os idosos se locomoverem. Terceiro, porque a dignidade e o bem-estar dos
idosos estão fortemente relacionados com a sua integração na comunidade
para que se possa dar a sua participação na vida da sociedade. (sem grifos
no original).
Almeja-se do constitucionalismo a consagração do
princípio da solidariedade e dos valores inerentes à fraternidade, mediante a
observância dos valores - descritos pelo jurista argentino Jose Roberto Dromi –
da verdade, solidariedade, consenso, continuidade, participação, integração e
universalidade.
O constitucionalismo do futuro ou
constitucionalismo do por vir, nada mais é do que uma nova perspectiva do
movimento constitucionalista e representa o que se espera do futuro do direito
constitucional.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BULOS, Uadi Lammêgo. Direito Constitucional ao alcance de todos. 2. Ed.
São Paulo: Saraiva, 2010.
CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito constitucional didático.
6.ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2010
LAZARI, Rafael José Nadim de. Reflexões críticas sobre a viabilidade de
um “constitucionalismo do futuro” no Brasil: exegese normativa. Revista de
Direitos Fundamentais e Democracia, Curitiba, v. 9, n. 9, p. 91-112, jan./jun.
2011.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 14 ed. São Paulo:
Saraiva, 2010.