Marcelly Gomes Dias de Lima
Barreto
Pamella Thayanne de Freitas
Pamella Suellen Queiroz
A proposta nuclear do presente trabalho
reside na análise das diferenças entre a técnica de ponderação proposta por
Ronald Dworkin e por Robert Alexy.
O estudo da ponderação de princípios como
instrumento propulsor do equilíbrio no âmbito do ordenamento jurídico. O
entendimento do processo de equilíbrio normativo será buscado a partir do
estudo acerca dos sopesamentos proporcionados pelas cargas valorativas trazidas
pelos princípios, enquadrando-os enquanto mandados de otimização.
Verifica-se também, o estudo da
ponderação diante dos pressupostos da argumentação jurídica, analisando-se,
principalmente, a colisão entre princípios jurídicos, partindo-se dos
entendimentos acerca da construção de graus de dimensões, em que os princípios
passarão por direcionamentos momentâneos para a resolução de conflitos.
A PROPOSTA DE DWORKIN
No presente estudo trataremos da
concepção de Dworkin acerca da diferenciação entre regras e princípios. Para
isso é necessário uma contextualização da sua posição em face do positivismo,
tendo em vista ser este o ponto de partida por meio do qual Dworkin estabelece
os pontos decisivos entre regras e princípios.
Antes disso, porém se fará uma remissão à
visão que Dworkin possui do próprio ordenamento, no qual a Integridade
exerce papel central, por meio da resposta correta, pois o autor “parte do pressuposto que todo caso possui
uma resposta correta (right answer), o que garante Integridade ao sistema jurídico.” A noção de resposta
correta “como um modelo ou como um norte
para a atividade do juiz, pois seria necessário um trabalho sobre-humano para
se chegar a ela.”
Para Dworkin a resposta correta também
existe mesmo nos hard cases, ou seja, deverá haver resposta correta nos
casos nos quais as regras não determinem uma única resposta. Assim a única
resposta seria determinada pela coerência do sistema jurídico, como bem
demonstra Cezne:
Pode se dizer que,
para Dworkin, o sistema de princípios deve permitir que exista uma resposta
correta também nos casos em que as regras não determinam uma única resposta.
Desta forma, a única resposta correta seria aquela que melhor se justificar em
termos de uma teoria substantiva, que tenha como elementos os princípios e as
ponderações de princípios que melhor correspondam à Constituição, às regras do
Direito e aos precedentes.
Para Dworkin “o positivismo é um modelo para um sistema de regras” e é com base nessa
concepção acerca dos positivistas que elabora seu conceito de princípios
jurídicos. Nesse sentido afirma o próprio Dworkin:
O positivismo, quero
sustentar, é um modelo de e para um sistema de regras, e sua noção central de
um teste fundamental único para o direito conduz-nos a perder a importante
função destes padrões (princípios e diretrizes políticas) que não são regras.
Assim para Dworkin os princípios são
padrões diferentes das regras e das políticas públicas.
Nessa linha Dworkin entende que “'política pública' é aquele tipo de padrão
que estabelece um objetivo a ser alcançado, geralmente uma melhoria em algum
aspecto econômico, político ou social da comunidade”, já os princípios se
ligam a uma outra questão do ponto de vista normativo, possuindo dimensão
moral: “chamo de princípio um padrão que
deve ser observado não porque ele avançará ou assegurará um estado econômico,
político ou social altamente desejável, mas porque ele é uma exigência de
justiça ou equidade ou de alguma outra dimensão da moralidade”.
Dworkin procura deixar claro as
diferenças entre as regras e os princípios. A primeira diferença se liga ao
ponto de aplicação das normas vez que “a
diferença entre princípios legais e regras jurídicas é uma distinção lógica”.
Assim esclarece que no âmbito da aplicação pode ser enunciada uma das
diferenças:
Ambos os tipos de
padrões apontam para decisões particulares sobre obrigações em circunstancias
particulares, mas eles diferem em função da direção que indicam. Regras são
aplicáveis em um modo de tudo-ou-nada. Se os fatos que uma regra enuncia
ocorrem, então a regra é válida, em cujo caso a resposta que proporciona deve
ser aceita, ou ela não é válida, em cujo caso ela não contribui em nada para a
decisão.
E segue dizendo:
Quando
princípios concorrem entre si (a política de proteção dos consumidores de
automóvel concorrendo com princípio de liberdade de contratar, por exemplo),
aquele a quem incumbe resolver o conflito deve tomar em consideração o peso
relativo de ambos. Não se pode ter aqui uma mensuração exata, e o juízo de que
um princípio ou política particular é mais importante que outra será
frequentemente uma decisão controversa. Não obstante, é um constituinte da
noção de princípio que ele tenha essa dimensão, que seja relevante perguntar o
quão importante ou qual peso ele possui.
Para acentuar a diferença do peso,
Dworkin afirma que regras não tem essa dimensão:
Nesse sentido, uma
regra jurídica pode ser mais importante do que outra porque ela possui um papel
maior ou mais importante na regulação do comportamento. Mas não se pode dizer
que uma regra é mais importante que do que outra dentro do sistema de regras,
de modo que, quando duas regras conflitassem, uma sobreporia a outra em virtude
de seu maior peso.
Apesar das diferenças acima elencadas o
próprio Dworkin admite que “em muitos
casos a distinção é difícil de ser feita – pode não haver sido estabelecido de
que modo o padrão deve operar, e este ponto pode ser um foco de controvérsia.”
Essas constatações de Dworkin deixam
claro que as especificidades do caso concreto são fundamentais para a definição
de que tipo de norma jurídica se está diante, em consequência disso qual o comportamento
na solução do caso.
A PROPOSTA DE ROBERT ALEXY
Trataremos a partir de agora da posição
de Alexy em face da técnica de ponderação.
Alexy toma a diferenciação entre regras e
princípios estabelecido por Dworkin como ponto de partida a partir do qual
busca a racionalização de uma teoria para os direitos fundamentais:
A enunciação de regras
e princípios realizada por Dworkin é aceita por Alexy, que parte dessa
teorização e procura sofisticá-la. O referido autor destaca a importância da
diferença entre normas do tipo regra, e normas do tipo princípio,
considerando-a como um marco de uma teoria normativa dos direitos fundamentais,
e um ponto de partida para responder à pergunta acerca das possibilidades e
limites da racionalidade no âmbito dos direitos fundamentais.
Para Alexy “o ponto decisivo na distinção entre regras e princípios é que princípios são normas que ordenam que
algo seja realizado na maior medida possível dentro das possibilidades
jurídicas e fáticas existentes”. Princípios são mandados de otimização,
que são caracterizados por poderem ser satisfeitos em graus variados e
pelo fato de que a medida devida de sua satisfação não depende somente das
possibilidades fáticas, mas também das possibilidades jurídicas. O âmbito das
possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras colidentes.
Essa diferença, Alexy também deixa claro
ao definir que as regras como normas são sempre ou satisfeitas ou não
satisfeitas. Assim afirma que:
Se uma regra vale,
então, deve se fazer exatamente aquilo que ela exige; nem mais, nem menos.
Regras contêm, portanto, determinações no âmbito daquilo que é fática e
juridicamente possível. Isso significa que a distinção entre regras e
princípios é uma distinção qualitativa, e não uma distinção de grau.
Para a solução de um conflito entre
regras deve ser introduzida em uma das regras, uma cláusula de exceção que
elimine o conflito, ou se pelo menos uma das regras for declarada inválida.
Desse modo há conflito quando duas regras que sejam aplicáveis ao caso deem
soluções contrárias para o caso concreto e não seja possível o estabelecimento
de uma cláusula de exceção, assim explica Alexy:
Não importa a forma
como sejam fundamentados, não é possível que dois juízos concretos de dever-ser
contraditórios entre si sejam válidos. Em um determinado caso, se se constata a
aplicabilidade de duas regras com consequências jurídicas concretas
contraditórias entre si, e essa contradição não pode ser eliminada por meio da
introdução de uma cláusula de exceção, então pelo menos uma das regras deve ser
declarada inválida.
Nesse ponto esclarece Alexy que “ao contrário do que ocorre com o conceito de
validade social ou importância da norma, o conceito de validade jurídica não é
graduável. Ou uma norma é válida, ou não é.”
Aqui há divergência entre os
posicionamentos de Alexy e Dworkin. Enquanto Dworkin entende que as cláusulas
são ao menos teoricamente enumeráveis para Alexy nunca é possível ter certeza
de que, em um novo caso, não será necessária a introdução de uma nova clausula
de exceção.
Já em termos de colisão de princípios
Alexy deixa claro que o modo de solução é diverso.
Se dois princípios colidem - o que
ocorre, por exemplo, quando algo é proibido de acordo com um princípio e, de
acordo com o outro, permitido -, um dos princípios terá de ceder. Isso não
significa, contudo, nem que o princípio cedente deva ser declarado inválido,
nem que nele deverá ser introduzida uma cláusula de exceção. Na verdade, o que
ocorre é que um dos princípios tem precedência em face de outro sob
determinadas condições. Sob outras condições a questão da precedência pode ser
resolvida de forma oposta.
Impende salientar que a noção de Alexy
sobre a precedência condicionada se liga ao fato de considerar que diante do
caso concreto os princípios possuem pesos diferentes e que aquele que tiver o
maior peso deve prevalecer. Assim surge uma diferença decisiva vez que conflito
entre regras ocorrem na dimensão da validade, enquanto as colisões entre
princípios - visto que só princípios válidos podem colidir - ocorrem, para além
dessa dimensão, na dimensão do peso.
Como expressão da ideia de otimização
Alexy se utiliza da máxima da proporcionalidade, com a qual segundo ele, a
teoria dos princípios se entrelaça fortemente. Há assim uma conexão
constitutiva pois a natureza dos princípios implica a máxima da
proporcionalidade, e essa implica aquela.
A máxima da proporcionalidade é a reunião
de três sub máximas: a da adequação, da necessidade e da proporcionalidade em
sentido estrito. E todos esses princípios expressam a idéia de otimização. Os
direitos constitucionais enquanto princípios expressam a idéia de otimização.
A diferenciação entre regras e princípios
proposta por Alexy de que “normas podem
ser distinguidas em regras e princípios e que entre ambos não existe apenas uma
diferença de grau, mas uma diferença qualitativa
trás uma valorização do princípio jurídico como realizador dos direitos
fundamentais”. Isso porque a máxima da proporcionalidade, expressão da
otimização, se configura como limitador as violações aos direitos fundamentais.
Nesse sentido é a vívida lição de Bonavides:
Ora, o princípio da
proporcionalidade - e esta é talvez a primeira de suas virtudes enquanto
princípio que limita as limitações aos direitos fundamentais - transforma,
enfim, o legislador num funcionário da Constituição, e estreita assim o espaço
de intervenção ao órgão especificamente incumbido de fazer as leis.
Justamente por conta desse papel de
limitação e de proteção dos direitos fundamentais que se verifica a relevância
da proporcionalidade, pois em se tratando de princípio vivo, elástico,
prestante, protege ele o cidadão contra excessos do Estado e serve de escudo à
defesa dos direitos e liberdades constitucionais.
Com a concepção de Dworkin percebe-se uma
distinção em bases estruturais, na qual resta demonstrado que a diferença entre
regras e princípios se dá especialmente no âmbito da aplicação.
Há de se destacar que com as críticas à
ponderação baseadas na teoria de discurso uma resposta pode ser apresentada com
base numa contextualização da teoria de Alexy, no âmbito de um conceito de
Direito. Assim podemos concluir que, se analisada com base na proposição de
criação de uma teoria procedimental, enquanto forma que determina o conteúdo,
elaborada por Alexy, a ponderação pode resistir à boa parte das críticas, em
especial àquelas que afirmam existir na ponderação um estabelecimento de
visão teleológica da moral.
Ainda pudemos constatar a pertinência da
teoria dos princípios como mandados de otimização com um Estado de Direito com
bases democráticas, no qual os princípios jogam papel central. Isso porque a
ponderação, que é expressão da otimização em termos das possibilidades jurídicas,
se configura em limite em face da ação estatal de restrição a direitos
fundamentais e ainda decorre da estrutura dos direitos fundamentais enquanto
princípios.
BIBLIOGRAFIA
<http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10617&revista_caderno=9>
Acesso em: 19 de Janeiro de 2013.
<http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10552>
Acesso em: 19 de Janeiro de 2013.
DWORKIN,
R. M. É o direito um sistema de regras?.
Estudos Jurídicos, São Leopoldo,
RS.
CEZNE,
Andrea Nárriman. A Teoria dos direitos
fundamentais: uma análise comparativa das perspectivas de Ronald Dworkin e
Robert Alexy. Revista de Direito Constitucional e Internacional, São Paulo.
BONAVIDES,
Paulo. Curso de direito constitucional. 7.ed. São Paulo: Malheiros, 1998 755p.