terça-feira, 18 de dezembro de 2012
domingo, 16 de dezembro de 2012
SOCIEDADE SIMPLES
SOCIEDADE
SIMPLES
Sérgio Luiz Batista Lage
Junior
Resumo
Com a
entrada em vigor do novo Código Civil Brasileiro, em janeiro de 2003,
importante alterações afetaram diretamente as atividades mercantis e civis. E
para bem entender isto, cumpre lembrar que o Código Comercial de 1850 e o
Código Civil de 1916, que regulavam o direito das sociedades, adotavam como
critério de divisão as atividades exercidas por elas. O atual sistema jurídico
passou a adotar divisão que não se apoiam mais na atividade desenvolvida, eis
que se fundamenta na teoria da empresa. Independente de eventuais conflitos
sobre o real conceito de empresa, interessa que agora, dependendo da existência
ou não do aspecto econômico da atividade, se uma pessoa desejar atuar
individualmente em algum segmento profissional, enquadrar-se-á como EMPRESÁRIO
ou AUTÔNOMO, conforme a situação. Caso preferir se reunir com uma ou mais
pessoas para, juntos, explorar alguma atividade, deverá constituir uma
sociedade, que poderá ser EMPRESÁRIA ou SIMPLES.
Em resumo, devemos nos acostumar
com uma nova divisão: a forma individual, isto é, o EMPRESÁRIO ou o AUTÔNOMO, e
a forma coletiva, representada pela SOCIEDADE EMPRESÁRIA ou pela SOCIEDADE SIMPLES.
Palavras
chaves: Direito comercial, sociedades simples, sócios, direitos
e deveres individuais, empresa e empresário.
Introdução
A
sociedade simples é um tipo societário criado como regra geral para sociedades
não empresárias, previstas entre os artigos 997 a 1.038 do CC. Vale lembrar que
as sociedades não empresárias podem se constituir por vários tipos societários,
inclusive aqueles estipulados para as sociedades empresárias. Contudo as
sociedades cooperativas, independente do objeto, sempre serão consideradas
sociedade simples. Dessa forma, as regras pertinentes à sociedade simples irão
regular todas as sociedades não empresárias e também servirá de subsídio para
as próprias sociedades empresárias, quando restar qualquer omissão na
legislação sobre os vários tipos societários.
Principais
regras
Cumpre
salientar que o contrato social da sociedade simples, documento escrito, deverá
ser registrado no Cartório Civil de Pessoas Jurídicas em até 30 (trinta) dias
da sua constituição. Se algum outro documento em separado estipular diretriz
contrária ao que determina o contrato, este será tido como ineficaz em relação
a terceiros.
Se
houver no contrato determinada cláusula que determine a exclusão de algum sócio
dos lucros da sociedade, esta cláusula será considerada nula, conforme
determina o art. 1.008:
Código
Civil - art. 1.008. É nula a estipulação contratual que exclua qualquer sócio
de participar dos lucros e das perdas.
Outro
aspecto importante é a regra trazida pelo art. 1.003 do CC, que dispõe sobre a
cessão de quotas, ou seja, o repasse da participação de um sócio no capital social,
na sociedade. Para que ocorra a cessão, que pode ser total ou parcial é
necessário o consentimento dos sócios bem como a modificação no contrato
social. Caso falte algum desses requisitos, a cessão será considerada ineficaz
em relação aos demais sócios, e em relação à própria sociedade. Vale dizer que
o sócio cedente, ou seja, aquele que repassou a quota, responderá
solidariamente com o cessionário (aquele que assumiu o lugar), pelas obrigações
sociais pelo prazo de dois anos após a modificação contratual.
Código
Civil - art. 1.003. A cessão total ou parcial de quota, sem a correspondente
modificação do contrato social com o consentimento dos demais sócios, não terá
eficácia quanto a estes e à sociedade.
Parágrafo
único. Até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, responde o
cedente solidariamente com o cessionário, perante a sociedade e terceiros,
pelas obrigações que tinha como sócio.
Direitos
e obrigações dos sócios
Os
sócios, porquanto membros formadores da sociedade possuem determinadas
obrigações, destacando-se dentre estas, a obrigação de contribuir na forma
estabelecida no contrato social para a integralização do capital. Essa
contribuição pode se dar em dinheiro, bens ou serviços.
Quando
a obrigação se der mediante prestação de serviços à sociedade, não pode o sócio
exercer atividade estranha à sociedade, a não ser que haja previsão contratual.
Fora disso, se a atividade for alheia aos interesses da sociedade, o sócio
poderá ser privado dos lucros, bem como ser excluído da sociedade, conforme
determina o art. 1.006:
Código
Civil - art. 1.006. O sócio, cuja contribuição consista em serviços, não pode,
salvo convenção em contrário, empregar-se em atividade estranha à sociedade,
sob pena de ser privado de seus lucros e dela excluído.
Já,
em se tratando de sócio que contribui com bens para a sociedade, ficará este
responsável por quaisquer consequências jurídicas que eventualmente possam
envolver os referidos bens. Da mesma forma, se a contribuição para a sociedade
se der por cessão de crédito, o sócio tem a obrigação de garantir que o devedor
faça jus à sua obrigação. O sócio que deixar de cumprir suas obrigações 30
(trinta) dias após uma notificação da sociedade, responderá por sua falta,
responsabilizando-se pelos danos provenientes da demora no cumprimento de sua
obrigação. Esse é o chamado sócio remisso. A lei permite aos demais sócios da
sociedade deliberar sobre a exclusão do sócio remisso, ou reduzir o montante de
sua quota, caso já tenha sido efetuada parte da integralização do capital. A
lei confere aos sócios determinados direitos, tais como: a participação nos
lucros na proporção da participação; participar das deliberações; direito de
preferência em adquirir novas quotas caso haja aumento no capital social; se retirar
da sociedade, dentre outros..
Administração
da sociedade
Primeiramente
é importante estabelecer que, quando a lei ou contrato social determinar que
cabe aos sócios decidirem sobre determinados negócios da sociedade, será
necessária deliberação dos sócios com aprovação pela maioria absoluta, conforme
as regras do art. 1.010 do CC. É através do órgão de administração que a
sociedade expressa sua vontade. Esse órgão é composto por administradores que
devem exercer a gestão da sociedade de forma leal e transparente. Há várias
vedações para que determinada pessoa seja administradora, todas estipuladas no
art. 1.011, § 1º do CC:
Normalmente
os administradores são designados no próprio contrato social, mas em caso de
deliberação em instrumento separado, deverá este ser averbado ao registro de
inscrição da sociedade. Qualquer ato praticado pelo administrador antes dessa
providência, implica em responsabilidade pessoal e solidária do administrador
perante a sociedade. Pode acontecer do contrato social não designar nenhuma
pessoa específica para a administração e, não havendo a designação em
instrumento separado, a administração caberá a cada sócio separadamente. Quando
se verificar vários administradores, deve haver votação entre os sócios para a
tomada de decisões, caso em que, se o administrador agir em desacordo com a
maioria, responderá por eventuais perdas e danos. Na omissão do contrato social,
os administradores poderão exercer quaisquer atos de gestão da sociedade, mas
quando se tratar da oneração ou alienação de bens imóveis da sociedade há
necessidade da aprovação por maioria dos sócios. Importante destacar que, se os
administradores no desempenho de suas funções, praticarem atos prejudiciais com
culpa, por estes responderão solidariamente perante a sociedade e terceiros. Pode
ocorrer de o administrador exceder seus poderes de gestão e esse excesso pode
ser oposto a terceiros desde alguma dessas hipóteses se configure:
-
limitação dos poderes do administrador está inscrita junto ao registro da
sociedade;
-
comprovação de que o terceiro sabia da limitação;
-
operação estranha ao objeto social da sociedade.
Ocorrendo,
então, pelo menos uma dessas hipóteses, a sociedade ficará eximida de cumprir
com as obrigações assumidas pelo administrador que agiu com excesso de poderes.
É a chamada Teoria Ultra Vires. Conforme determina o art. 1.017 do CC, o
administrador que, sem consentimento escrito dos sócios, aplicar créditos ou
bens sociais em proveito próprio ou de terceiros, terá a obrigação de
restituí-los à sociedade, ou pagar o equivalente, com todos os lucros
resultantes, e, se houver prejuízo, por ele também responderá. Em regra geral o
administrador não pode se fazer substituir por outrem, contudo pode este nomear
alguém para que desempenhe determinados atos dentro dos limites de seus
poderes. Importante mencionar que os poderes conferidos aos sócios
administradores pelo contrato social são irrevogáveis, ou seja, não poderão ser
destituídos a menos que seja comprovada, via judicial, justa causa a pedido de
qualquer dos sócios. Já, em se tratando de determinados poderes conferidos a
sócios ou não sócios por ato separado, estes poderão ser revogados a qualquer
tempo. Por fim, aos administradores é obrigatória a prestação de contas, que
deve ser demonstrada aos sócios periodicamente.
Relações
com terceiros
O
contrato social é que determina a responsabilidade dos sócios dentro da
sociedade, mas ainda que a responsabilidade destes seja ilimitada,
primeiramente os bens da sociedade é que serão atacados para o pagamento das
dívidas, para depois serem atacados os bens particulares dos sócios, na
proporção da participação de cada sócio no capital social. Isso ocorre em
virtude do benefício de ordem. Na hipótese da morte do cônjuge de um dos sócios
ou em caso de separação judicial, não poderão os herdeiros e o ex-cônjuge
exigir a parte que lhes cabe na quota social. Apenas concorrerão à divisão
periódica dos lucros até a liquidação da sociedade. Outro aspecto interessante
diz respeito ao credor particular de determinado sócio. Em caso de
inadimplemento da obrigação, o credor pode executar os lucros provenientes da
sociedade ou da parte que seria devida ao sócio em caso de liquidação. A lei
faculta ao credor do sócio, ainda, requerer a liquidação da quota do devedor,
hipótese que configura a dissolução parcial da sociedade..
Dissolução parcial da
sociedade
Conforme
já fora dito, o credor particular de sócio tem direito de pedir a liquidação da
quota do devedor a fim de receber o que lhe é devido, sendo essa uma das
hipóteses de dissolução parcial da sociedade. Ocorre que a lei ainda prevê
outras situações que ensejam a dissolução parcial como a morte, retirada ou
exclusão de determinado sócio. Quando falece um sócio, a regra geral é que se
proceda a liquidação de sua quota, apurando os valores devidos a ele para o
pagamento dos direitos dos herdeiros e do cônjuge sobrevivente. Contudo, pode o
contrato prever, em caso de morte, uma solução diferente, e nesse caso
prevalecerá o contrato. Os sócios podem, também, estipular mediante acordo com
os herdeiros a substituição do sócio falecido. Assim, pode ser desnecessária,
nessas hipóteses, a liquidação das quotas do sócio falecido. Outra hipótese
possível seria aquela em que os sócios restantes, após a morte de um membro,
não tenham interesse na continuidade da sociedade. Nesse caso não haverá a
liquidação da quota do falecido, mas a completa dissolução da sociedade. Pode
um sócio, por sua vontade, se retirar da sociedade, sendo esse um direito seu,
denominado direito de recesso. Para o exercício desse direito deve ser
observado um detalhe muito importante: o prazo de duração da sociedade. Caso a
sociedade seja por prazo indeterminado, o sócio poderá se retirar após
notificação aos demais sócios com pelo menos 60 (sessenta) dias de
antecedência. Já, se a sociedade for por tempo determinado, o exercício do
direito de recesso somente poderá ser exercido após a comprovação judicial de
justa causa. A última hipótese de dissolução da sociedade é aquela que confere
aos sócios a possibilidade de excluir um sócio por falta grave no desempenho de
suas funções ou incapacidade superveniente. Nessas hipóteses é necessária a
iniciativa da maioria dos sócios restantes para pleitear judicialmente a
exclusão. No caso da decretação da falência ou liquidação da quota de sócio por
credor particular, a exclusão do mesmo se dará de pleno direito. A liquidação
das quotas se dá através da apuração de haveres, que significa a verificação do
saldo existente para ser repassado ao sócio que vai deixar a sociedade. A
verificação desse montante levará em consideração a situação financeira da
sociedade na data em que houve a dissolução parcial, ou seja, a saída daquele
sócio. Essa verificação levará em conta todo o patrimônio real da sociedade. Uma
vez constatado o valor, haverá redução no capital social, e o montante será
pago ao sócio que sai da sociedade em dinheiro, no prazo de 90 (noventa) dias
da liquidação. Mas será garantido aos demais sócios a possibilidade suprirem o
valor da quota liquidada, de modo a evitar a redução do capital social.
Dissolução
total da sociedade
A
dissolução total da sociedade se dará quando ocorrer uma causa que pode levar à
extinção da pessoa jurídica. Há dois tipos de dissolução total: de pleno
direito e a judicial. As causas de dissolução de pleno direito se encontram no
art. 1.033 do CC e são cinco hipóteses:
-
Vencimento do prazo de duração. Ainda que a sociedade seja com prazo certo,
pré-estabelecido, se não houver oposição dos sócios, esta se prorrogará por
prazo indeterminado, ocorrendo o que se convencionou chamar de prorrogação
automática.
-
Consenso unânime dos sócios. Independente do prazo de duração da sociedade,
seja determinado ou indeterminado, quando a vontade de todos os sócios for de
extinguir a pessoa jurídica, haverá a dissolução da sociedade.
-
Deliberação dos sócios, por maioria absoluta, na sociedade de prazo
indeterminado. A doutrina e a jurisprudência criticam essa possibilidade pois
deve sempre ser buscada a continuidade da empresa e da sociedade, e no caso, se
for da vontade de determinados sócios a dissolução, podem estes utilizarem da
dissolução parcial, não havendo necessidade de se extinguir por completo a
sociedade.
-
Falta de pluralidade de sócios, não reconstituída no prazo de cento e oitenta
dias. Na legislação anterior quando a sociedade se encontrava com um único
sócio, a mesma era dissolvida. Em virtude do princípio da conservação da
empresa, admite-se que a sociedade permaneça transitoriamente com apenas um
sócio, mas desde que seja no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias.
-
Extinção na forma da lei, de autorização para funcionar. Quando a autorização
para o funcionamento da sociedade for revogada ou passar o prazo delimitado, a
sociedade não poderá exercer a mesma atividade. A autorização de funcionamento
é condição sem a qual a sociedade não pode existir, motivando, assim, sua
dissolução.
Vale
ressaltar que uma vez verificada essa hipótese o Ministério Público é parte
legítima para pedir a liquidação da sociedade, se depois de 30 (trinta) dias
não tiver sido tomada essa atitude pela própria sociedade. Se o MP se mantiver
inerte após 15 (quinze) dias da comunicação da dissolução, a autoridade
competente também poderá tomar providências que resultarão na liquidação da
sociedade. Já o art. 1.034 do CC dispõe sobre as causas de dissolução total da
sociedade por via judicial. São duas causas principais, que podem ser alegadas
por qualquer sócio:
-
Quando for anulado o ato de constituição da sociedade. Nesse caso está-se
diante da possibilidade de dissolução judicial por vício no próprio contrato,
ato de constituição da sociedade. Importante lembrar que, quando há a
celebração de determinado negócio jurídico, as partes devem ser capazes, o
objeto deve ser lícito e ainda que se componha da forma prescrita ou não
proibida pela lei. Outros vícios possíveis são os aqueles provenientes do
consentimento: erro, dolo, coação, simulação ou fraude. Importante lembrar que
há prazo para requerer a anulação do ato de constituição da sociedade, que será
de três anos, contados do registro efetuado.
-
Exaurido o fim social, ou verificada a sua inexequibilidade. Nesse caso, a
dissolução pode ser pedida quando a existência da pessoa jurídica se deu
unicamente para o cumprimento de determinado objetivo, que já fora atingido ou
então, quando se verifica a impossibilidade de se atingir a finalidade
pretendida.
Importante
mencionar ainda que o contrato social também poderá prever outras hipóteses de
dissolução da sociedade, que serão devidamente comprovadas perante o juiz
quando se verificar a ocorrência de uma das hipóteses acordadas, conforme
anuncia o art. 1.035 do CC:
Código
Civil - art. 1.035. O contrato pode prever outras causas de dissolução, a serem
verificadas judicialmente quando contestadas.
Observação:
uma vez decretada a dissolução da sociedade, passa-se à liquidação, ato
necessário para a apuração do patrimônio social, eventuais débitos e créditos.
Dessa forma, os administradores da sociedade elegem o liquidante, que irá gerir
esse procedimento, sendo autorizado ao mesmo efetuar apenas negócios
inadiáveis. Caso o liquidante efetue outras operações, ele será
responsabilizado solidária e ilimitadamente pelas obrigações assumidas.
Referencial
Teórico
COELHO,
Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial,
volume 1 : direito de empresa / Fábio Ulhoa Coelho. 15 ed. São Paulo: Saraiva,
2011.
GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti
Perrotta Rios e Gonçalves, Victor Eduardo Rios Gonçalves. Direito comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 4.
ed. São Paulo: Saraiva, 2011. (Coleção sinopses jurídicas; v. 21)
RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito empresarial esquematizado. Rio
de Janeiro: Forense. São Paulo: MÉTODO. 2010.
sexta-feira, 14 de dezembro de 2012
ANÁLISE DO COMPORTAMENTO E A COERÇÃO NO SISTEMA PENAL
[2]NICOLY
RAFAELLA SANTOS DA COSTA MUNIZ
RESUMO: O presente artigo visa apresentar a análise do comportamento e sua
influencia no direito, no que concerne a elaboração de leis e medidas de
controle da violência, no sistema jurídico penal brasileiro. O objetivo é
explorar dois aspectos: primeiro o desconhecimento dos princípios comportamentais
descritos pela ciência do comportamento e segundo a ineficácia de um sistema
baseado apenas na coerção como forma de controle comportamental.
Palavras chaves: direito, comportamento, coerção.
1 Introdução
Em nossa sociedade, a violência tem aumentado de
maneira significava e as leis conseqüentemente ficam cada vez mais rígidas. Mas
quais teorias se baseiam os fundamentos dessas leis? Quem são os seus mentores
e seu conhecimento acerca do comportamento humano? Porque o sistema
penitenciário não tem conseguido alcançar seu objetivo? São essas indagações
que procuraremos analisar.
O que parece, com base nas incoerências
apresentadas nas leis que tentam combater a violência, é que formadas com base
em opiniões, costumes e observações, sem levar em conta o conhecimento
produzido pela ciência. Essa falta de conhecimento e aplicação torna as medidas
tomadas pouco eficazes em sua proposta.
O Direito possui por objetivo a criação de normas
que visam instruir os indivíduos de uma dada sociedade a reger suas práticas
cotidianas levando em consideração o que é aceitável por esta sociedade, de
acordo com o bem geral de toda a comunidade. Ao violar normas jurídicas, o
sujeito sofrerá pelo Estado, que possui o jus
puniendi, uma sanção, que pode acontecer de várias formas.
Logo, o Direito lida diretamente com o
comportamento humano, avaliando-o e julgando-o. Nesse sentido, nosso objetivo é
apresentar a análise do comportamento que dever ser aproveitado dentro da área do
Direito.
2 O Estudo do Comportamento
O americano John B. Watson foi quem iniciou os
estudos sobre a análise do comportamento, que ficou conhecida de Behaviorismo,
pois behavior significa
comportamento. O comportamento é entendido como interação entre indivíduo e
ambiente.
B. F. Skinner (1904-1990) foi um dos mais
importantes behavioristas que estudou a Ciência do comportamento, sua linha de
pensamento ficou conhecida como Behaviorismo Radical e a base de sua corrente
está na formulação do comportamento operante, que explicaremos mais adiante
(BOCK, 2008).
O comportamento, como qualquer objeto de estudo
científico, é ordenado, pode ser explicado, pode ser previsto desde que se
tenham os dados necessários, e pode ser controlado. Chama-se a isso determinismo, a noção de que o comportamento é
determinado pela hereditariedade e pelo ambiente.
Skinner (1990) propõe então, que o comportamento
seja estudado através do modelo causal de seleção por conseqüências. Segundo
esse modelo, o comportamento humano seria resultado de três processos de
variação e seleção:
1.
A seleção
natural responsável pela evolução e pelas características físicas da espécie, e
por comportamentos comuns a todos os seus membros;
2.
O
condicionamento operante: variações no comportamento do indivíduo são
selecionadas por aspectos do ambiente que não são estáveis o suficiente para
terem um papel na evolução;
3.
A cultura:
os indivíduos aprendem a se comportar através dos comportamentos já adquiridos
por outros membros da espécie.
A análise do comportamento representa uma instância
do comportamento. Ele deve ser entendido como a inter-relação entre o organismo
e o ambiente. Sendo que, o ambiente não é somente o que é externo ao
organismo, e sim o que se relaciona ao comportamento. Nesse sentido, alterações
neuroquímicas e fisiológicas, normas sociais, grupos, são todos ambientes para
o comportamento.
Quanto à classificação, os comportamentos podem ser
classificados em dois grandes grupos:
1. Comportamentos Respondentes: é o que chamamos de
“não voluntário” e inclui as respostas que são produzidas por estímulos
antecedentes do ambiente, ou seja, nos comportamentos respondentes um evento ambiental antecedente produz uma resposta todas as vezes em que é apresentado.
Respostas emocionais geradas pela punição como choro, medo, ansiedade e raiva
podem ser condicionadas e aparecerem em outras situações não punitivas.
2. Comportamentos Operantes: nos comportamentos
operantes um evento ambiental antecedente sinaliza a probabilidade de que o
organismo, ao
apresentar uma determinada resposta, produza
uma determinada conseqüência. Por exemplo, uma
criança ao parar de mexer no rádio porque recebeu um tapa do pai, aumenta a
probabilidade do pai de usar o tapa em outras situações em que ele queira
cessar um comportamento da criança (Skinner, 1999).
Esse comportamento operante pode ser representado
da seguinte maneira:
R (resposta)
S (estímulo)
|
Os comportamentos operantes, são os comportamentos
que abrangem a maior parte das atividades do
comportamento humano, por isso caracteriza a maioria de nossas interações com o
ambiente. Portanto a principal unidade de análise utilizada pela análise do
comportamento é o comportamento R-S.
A resposta é o movimento ou a mudança observada em
um organismo individual, enquanto os estímulos são todos os eventos ambientais
que não as respostas a serem analisadas, e que afetam a probabilidade de
emissão de respostas similares no futuro. Importante salientar que a resposta
não é o comportamento é apenas uma instância deste.
Fazendo uma distinção entre os eventos antecedentes
e eventos conseqüentes, vemos que a conseqüência de uma resposta é um evento produzido por esta resposta e que pode aumentar
ou diminuir a freqüência de respostas
similares àquela que a produziu. Eventos conseqüentes que aumentam a freqüência
das respostas que os produziram são chamados de reforçadores e eventos que
diminuem a freqüência das respostas que os produziram são chamados de punidores.
Reforçadores e punidores também alteram a
probabilidade de ocorrência de respostas similares futuras na presença dos
antecedentes similares àqueles presentes quando uma resposta foi
conseqüenciada. Ou seja, os estímulos antecedentes sinalizam que se determinada
resposta for emitida ocorrerá o evento conseqüente. Os estímulos antecedentes, por
sua vez, podem ter ao menos uma de duas funções:
1. aumentar ou diminuir a probabilidade de
ocorrência de certas respostas, devido a uma história de pareamento com a
produção de conseqüências por respostas similares nessas situações;
2. estabelecer a efetividade das conseqüências
(Skinner, 2002). Ex. Uma criança num supermercado deseja um chocolate, mas a
mãe diz que não vai dá. A criança começa a fazer birra e a mãe acaba dando o
chocolate. A mãe reforça o comportamento de birra do filho, aumentando a
probabilidade de que em situações similares (outros supermercados, lanchonetes,
lojas, etc) a criança emita comportamento de birra quando não atendida em um
pedido. Perceba que o comportamento da mãe de dar o item frente a birra da
criança também é reforçado pela retirada do estímulo aversivo (a birra).
Reforçadores e punidores são também subdivididos em
positivos e negativos. Um reforçador positivo significa que ao apresentar um
estímulo a taxa do comportamento aumentou, e o reforçador negativo significa
que ao retirar um estímulo a taxa do comportamento aumentou.
Punição positiva é a queda na taxa do comportamento
com a apresentação de um estímulo, e punição negativa é a queda da taxa do
comportamento com a retirada de um estímulo. Perceba que positivo e negativo
não significam um juízo de valor, mas somente dizem respeito, respectivamente,
a apresentação e retirada de um estímulo.
No exemplo acima da birra da criança, dizemos que a
birra foi reforçada positivamente (a criança recebe o chocolate, ou seja, um
estímulo é apresentado), e o comportamento da mãe de dar o chocolate foi
reforçado negativamente (ao dar o chocolate a criança para de fazer birra, ou
seja, um estímulo é retirado).
3 O efeito da coerção
O controle social sobre que a sociedade utiliza
para controlar o comportamento é a coerção, que é o uso da punição e do
reforçamento negativo para conseguir que os outros ajam como gostaríamos e a
prática de recompensar pessoas deixando-as escapar de nossas punições e ameaças
(Sidman, 1995). Implantamos a educação através do medo seja nas relações
interpessoais, nas instituições educacionais, governamentais, legais ou
religiosas. Até a motivação para os estudos está no medo de sermos reprovados
pela escola, humilhados por professores ou agredidos pelos pais, obedecemos às
leis para não irmos para a cadeia ou sermos multados.
Essa realidade tem que ser transformada, estudos da
Análise do Comportamento vem demonstrando que a longo prazo, a coerção gera
violência, depressão, ansiedade dentre outros.
É difícil
não fazer uso da coerção, pois ela cessa de imediato o comportamento do outro,
e isso acaba fazendo com que esse mecanismo de controle pareça eficaz.
Entretanto, os efeitos negativos a longo prazo da coerção não são percebidos
como produtos de seu uso. Ou seja, quem geralmente utiliza essa forma de
controle é imediatamente recompensado, e somente os resultados retardados são
censuráveis.
Skinner
(1971) e Sidman (1995) apontam que quanto maior o grau de aversividade no
ambiente, maior é a probabilidade de emissão de comportamentos agressivos.
Algumas evidências obtidas em estudos experimentais com animais embasam tal
hipótese.
Nesse
sentido, uma pessoa condenada pelo sistema judicial à cadeia, e submetida há
anos a um sistema penitenciário violento, bruto, coercitivo, tende a
desenvolver comportamentos criminosos mais elaborados, além de aumentar os
comportamentos violentos.
4 A função da pena
A coerção se reflete nas nossas leis e legislação
no Código Penal, verificamos que a pena possui o caráter retribuitivo e
preventivo, bastando a pena em si mesma. Para Kant, como assinala Santoro Filho
(2000), a pena não pode ser afastada em hipótese alguma, por ser uma
retribuição ao mal praticado, pois caso não seja aplicada, a sociedade seria
repleta do delito.
O que queremos chamar a atenção é que a função
retribuitiva preocupa-se em punir o ato criminoso de forma que não passe em
branco o delito cometido. O problema é que a preocupação em apenas ter
que punir o sujeito, desvia nossa percepção de aspectos mais relevantes como
elaborar penas que evite a reincidência do ato. Um sistema que consiste em
apenas punir o sujeito, sem promover o aprendizado de novos comportamentos,
achando que isso é suficiente para a não reincidência está condenado ao
fracasso. O uso exclusivo da coerção como forma de controle não é suficiente
para eliminar comportamentos indesejados.
O caráter preventivo especial é obtido pela coação
psicológica, consistente na cominação da pena para a conduta desvalorada
socialmente e na sua aplicação e execução para aquele que incorre na ação
criminosa. A pena passa a possuir como maior função incutir nos membros da
sociedade o medo do castigo, a partir não somente da previsão legal da sanção
para os tipos de crimes, como também pelo exemplo conferido com a aplicação e
execução desta sanção aos que praticam tais condutas.
A prevenção geral também é passível de severas
críticas, pois para alcançar o fim desejado intimida-se certos comportamentos
dos indivíduos, pode-se criar um Estado do Terror, autoritário, que se utiliza
da norma penal como ameaça, incutindo medo aos membros da sociedade. Além
disso, como também já vimos, esse tipo de medida desenvolve comportamentos de
subterfúgio.
O artigo 10 da Lei de Execuções
Penais incide no momento da execução, tem por fim evitar que o criminoso
pratique novos crimes, seja recuperando-o e readaptando-o à vida social
ajustada, de acordo com as normas jurídicas. Novamente caímos no problema de
usar o medo como forma de controle. Por mais que mude as medidas, ou os nomes
dados às práticas, a coerção, o medo e a agressão são uma constante na busca do
controle do comportamento criminoso. Há uma evidente dificuldade de se pensar
formas de controle do comportamento que não sejam pelo medo. Outro aspecto
relevante da prevenção especial é sobre o segregamento.
No Brasil não é fácil ressocializar, pois nosso
sistema prisional, além de oferecer aos presos um tratamento cruel e desumano,
sem nenhum planejamento ou condição de ressocialização, possui suas diretrizes
completamente baseadas em medidas coercitivas que não produzem os resultados a
que se destinam.
5 Considerações finais
Devemos focar nossas avaliações nas relações do sujeito com seu meio
cultural, econômico e social. Skinner (1971) defende tal posição quando diz que
aumentando o sentido das responsabilidades pessoais não resolveremos problemas
como o crime. O ambiente é o responsável pelo comportamento, e é ele que deve
sofrer alterações, não qualquer atributo do indivíduo.
Medidas adequadas na resolução da criminalidade e
na ressocialização, dependem desde mudanças socioeconômicas tomadas pelo Estado
até à reestruturação de todo nosso conhecimento sobre o comportamento humano.
Skinner (1971) chama a atenção que a física e a biologia, por exemplo, possuem
um grau considerável de desenvolvimento do conhecimento que não se observa na
área da ciência do comportamento humano.
Profissionais que lidam diretamente com o comportamento
humano, e principalmente, aqueles que o julgam e escrevem diretrizes de como as
pessoas devem se comportar, não podem descartar todo um arcabouço teórico e
científico produzido por uma área de conhecimento.
Ao que tudo indica, nossa legislação e diretrizes
penais no Direito, foram construídas e são mantidas com base na tradição,
status, poder ou autoridade das agências controladoras, independentemente das
alterações no ambiente (resultados) que elas acarretam. Uma cultura que
construa suas diretrizes com base em conhecimentos tecnológicos aumenta o
âmbito de ação e a eficácia do comportamento que altera o ambiente na direção
de garantir sobrevivência e a satisfação do indivíduo e da sociedade.
Nesse sentido, defendemos uma maior interação entre
o Direito e áreas em que haja uma construção científica do conhecimento,
descartando a tradição e a autoridade como critérios de validade. O que deve
selecionar se um conhecimento é válido ou não, é a possibilidade de ação que
ele permite, e os resultados derivados de sua prática.
Referências Bibliográficas:
BOCK, Ana
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