domingo, 16 de dezembro de 2012

SOCIEDADE SIMPLES


SOCIEDADE SIMPLES
Sérgio Luiz Batista Lage Junior

Resumo
Com a entrada em vigor do novo Código Civil Brasileiro, em janeiro de 2003, importante alterações afetaram diretamente as atividades mercantis e civis. E para bem entender isto, cumpre lembrar que o Código Comercial de 1850 e o Código Civil de 1916, que regulavam o direito das sociedades, adotavam como critério de divisão as atividades exercidas por elas. O atual sistema jurídico passou a adotar divisão que não se apoiam mais na atividade desenvolvida, eis que se fundamenta na teoria da empresa. Independente de eventuais conflitos sobre o real conceito de empresa, interessa que agora, dependendo da existência ou não do aspecto econômico da atividade, se uma pessoa desejar atuar individualmente em algum segmento profissional, enquadrar-se-á como EMPRESÁRIO ou AUTÔNOMO, conforme a situação. Caso preferir se reunir com uma ou mais pessoas para, juntos, explorar alguma atividade, deverá constituir uma sociedade, que poderá ser EMPRESÁRIA ou SIMPLES.
            Em resumo, devemos nos acostumar com uma nova divisão: a forma individual, isto é, o EMPRESÁRIO ou o AUTÔNOMO, e a forma coletiva, representada pela SOCIEDADE EMPRESÁRIA ou pela SOCIEDADE SIMPLES.


Palavras chaves: Direito comercial, sociedades simples, sócios, direitos e deveres individuais, empresa e empresário.
Introdução
A sociedade simples é um tipo societário criado como regra geral para sociedades não empresárias, previstas entre os artigos 997 a 1.038 do CC. Vale lembrar que as sociedades não empresárias podem se constituir por vários tipos societários, inclusive aqueles estipulados para as sociedades empresárias. Contudo as sociedades cooperativas, independente do objeto, sempre serão consideradas sociedade simples. Dessa forma, as regras pertinentes à sociedade simples irão regular todas as sociedades não empresárias e também servirá de subsídio para as próprias sociedades empresárias, quando restar qualquer omissão na legislação sobre os vários tipos societários.
Principais regras
Cumpre salientar que o contrato social da sociedade simples, documento escrito, deverá ser registrado no Cartório Civil de Pessoas Jurídicas em até 30 (trinta) dias da sua constituição. Se algum outro documento em separado estipular diretriz contrária ao que determina o contrato, este será tido como ineficaz em relação a terceiros.
Se houver no contrato determinada cláusula que determine a exclusão de algum sócio dos lucros da sociedade, esta cláusula será considerada nula, conforme determina o art. 1.008:  
Código Civil - art. 1.008. É nula a estipulação contratual que exclua qualquer sócio de participar dos lucros e das perdas.

Outro aspecto importante é a regra trazida pelo art. 1.003 do CC, que dispõe sobre a cessão de quotas, ou seja, o repasse da participação de um sócio no capital social, na sociedade. Para que ocorra a cessão, que pode ser total ou parcial é necessário o consentimento dos sócios bem como a modificação no contrato social. Caso falte algum desses requisitos, a cessão será considerada ineficaz em relação aos demais sócios, e em relação à própria sociedade. Vale dizer que o sócio cedente, ou seja, aquele que repassou a quota, responderá solidariamente com o cessionário (aquele que assumiu o lugar), pelas obrigações sociais pelo prazo de dois anos após a modificação contratual.

Código Civil - art. 1.003. A cessão total ou parcial de quota, sem a correspondente modificação do contrato social com o consentimento dos demais sócios, não terá eficácia quanto a estes e à sociedade.
Parágrafo único. Até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, responde o cedente solidariamente com o cessionário, perante a sociedade e terceiros, pelas obrigações que tinha como sócio.
Direitos e obrigações dos sócios
Os sócios, porquanto membros formadores da sociedade possuem determinadas obrigações, destacando-se dentre estas, a obrigação de contribuir na forma estabelecida no contrato social para a integralização do capital. Essa contribuição pode se dar em dinheiro, bens ou serviços.
Quando a obrigação se der mediante prestação de serviços à sociedade, não pode o sócio exercer atividade estranha à sociedade, a não ser que haja previsão contratual. Fora disso, se a atividade for alheia aos interesses da sociedade, o sócio poderá ser privado dos lucros, bem como ser excluído da sociedade, conforme determina o art. 1.006:
Código Civil - art. 1.006. O sócio, cuja contribuição consista em serviços, não pode, salvo convenção em contrário, empregar-se em atividade estranha à sociedade, sob pena de ser privado de seus lucros e dela excluído.
Já, em se tratando de sócio que contribui com bens para a sociedade, ficará este responsável por quaisquer consequências jurídicas que eventualmente possam envolver os referidos bens. Da mesma forma, se a contribuição para a sociedade se der por cessão de crédito, o sócio tem a obrigação de garantir que o devedor faça jus à sua obrigação. O sócio que deixar de cumprir suas obrigações 30 (trinta) dias após uma notificação da sociedade, responderá por sua falta, responsabilizando-se pelos danos provenientes da demora no cumprimento de sua obrigação. Esse é o chamado sócio remisso. A lei permite aos demais sócios da sociedade deliberar sobre a exclusão do sócio remisso, ou reduzir o montante de sua quota, caso já tenha sido efetuada parte da integralização do capital. A lei confere aos sócios determinados direitos, tais como: a participação nos lucros na proporção da participação; participar das deliberações; direito de preferência em adquirir novas quotas caso haja aumento no capital social; se retirar da sociedade, dentre outros..
Administração da sociedade
Primeiramente é importante estabelecer que, quando a lei ou contrato social determinar que cabe aos sócios decidirem sobre determinados negócios da sociedade, será necessária deliberação dos sócios com aprovação pela maioria absoluta, conforme as regras do art. 1.010 do CC. É através do órgão de administração que a sociedade expressa sua vontade. Esse órgão é composto por administradores que devem exercer a gestão da sociedade de forma leal e transparente. Há várias vedações para que determinada pessoa seja administradora, todas estipuladas no art. 1.011, § 1º do CC:
Normalmente os administradores são designados no próprio contrato social, mas em caso de deliberação em instrumento separado, deverá este ser averbado ao registro de inscrição da sociedade. Qualquer ato praticado pelo administrador antes dessa providência, implica em responsabilidade pessoal e solidária do administrador perante a sociedade. Pode acontecer do contrato social não designar nenhuma pessoa específica para a administração e, não havendo a designação em instrumento separado, a administração caberá a cada sócio separadamente. Quando se verificar vários administradores, deve haver votação entre os sócios para a tomada de decisões, caso em que, se o administrador agir em desacordo com a maioria, responderá por eventuais perdas e danos. Na omissão do contrato social, os administradores poderão exercer quaisquer atos de gestão da sociedade, mas quando se tratar da oneração ou alienação de bens imóveis da sociedade há necessidade da aprovação por maioria dos sócios. Importante destacar que, se os administradores no desempenho de suas funções, praticarem atos prejudiciais com culpa, por estes responderão solidariamente perante a sociedade e terceiros. Pode ocorrer de o administrador exceder seus poderes de gestão e esse excesso pode ser oposto a terceiros desde alguma dessas hipóteses se configure:
- limitação dos poderes do administrador está inscrita junto ao registro da sociedade;
- comprovação de que o terceiro sabia da limitação;
- operação estranha ao objeto social da sociedade.
Ocorrendo, então, pelo menos uma dessas hipóteses, a sociedade ficará eximida de cumprir com as obrigações assumidas pelo administrador que agiu com excesso de poderes. É a chamada Teoria Ultra Vires. Conforme determina o art. 1.017 do CC, o administrador que, sem consentimento escrito dos sócios, aplicar créditos ou bens sociais em proveito próprio ou de terceiros, terá a obrigação de restituí-los à sociedade, ou pagar o equivalente, com todos os lucros resultantes, e, se houver prejuízo, por ele também responderá. Em regra geral o administrador não pode se fazer substituir por outrem, contudo pode este nomear alguém para que desempenhe determinados atos dentro dos limites de seus poderes. Importante mencionar que os poderes conferidos aos sócios administradores pelo contrato social são irrevogáveis, ou seja, não poderão ser destituídos a menos que seja comprovada, via judicial, justa causa a pedido de qualquer dos sócios. Já, em se tratando de determinados poderes conferidos a sócios ou não sócios por ato separado, estes poderão ser revogados a qualquer tempo. Por fim, aos administradores é obrigatória a prestação de contas, que deve ser demonstrada aos sócios periodicamente.
Relações com terceiros
O contrato social é que determina a responsabilidade dos sócios dentro da sociedade, mas ainda que a responsabilidade destes seja ilimitada, primeiramente os bens da sociedade é que serão atacados para o pagamento das dívidas, para depois serem atacados os bens particulares dos sócios, na proporção da participação de cada sócio no capital social. Isso ocorre em virtude do benefício de ordem. Na hipótese da morte do cônjuge de um dos sócios ou em caso de separação judicial, não poderão os herdeiros e o ex-cônjuge exigir a parte que lhes cabe na quota social. Apenas concorrerão à divisão periódica dos lucros até a liquidação da sociedade. Outro aspecto interessante diz respeito ao credor particular de determinado sócio. Em caso de inadimplemento da obrigação, o credor pode executar os lucros provenientes da sociedade ou da parte que seria devida ao sócio em caso de liquidação. A lei faculta ao credor do sócio, ainda, requerer a liquidação da quota do devedor, hipótese que configura a dissolução parcial da sociedade..
Dissolução parcial da sociedade
Conforme já fora dito, o credor particular de sócio tem direito de pedir a liquidação da quota do devedor a fim de receber o que lhe é devido, sendo essa uma das hipóteses de dissolução parcial da sociedade. Ocorre que a lei ainda prevê outras situações que ensejam a dissolução parcial como a morte, retirada ou exclusão de determinado sócio. Quando falece um sócio, a regra geral é que se proceda a liquidação de sua quota, apurando os valores devidos a ele para o pagamento dos direitos dos herdeiros e do cônjuge sobrevivente. Contudo, pode o contrato prever, em caso de morte, uma solução diferente, e nesse caso prevalecerá o contrato. Os sócios podem, também, estipular mediante acordo com os herdeiros a substituição do sócio falecido. Assim, pode ser desnecessária, nessas hipóteses, a liquidação das quotas do sócio falecido. Outra hipótese possível seria aquela em que os sócios restantes, após a morte de um membro, não tenham interesse na continuidade da sociedade. Nesse caso não haverá a liquidação da quota do falecido, mas a completa dissolução da sociedade. Pode um sócio, por sua vontade, se retirar da sociedade, sendo esse um direito seu, denominado direito de recesso. Para o exercício desse direito deve ser observado um detalhe muito importante: o prazo de duração da sociedade. Caso a sociedade seja por prazo indeterminado, o sócio poderá se retirar após notificação aos demais sócios com pelo menos 60 (sessenta) dias de antecedência. Já, se a sociedade for por tempo determinado, o exercício do direito de recesso somente poderá ser exercido após a comprovação judicial de justa causa. A última hipótese de dissolução da sociedade é aquela que confere aos sócios a possibilidade de excluir um sócio por falta grave no desempenho de suas funções ou incapacidade superveniente. Nessas hipóteses é necessária a iniciativa da maioria dos sócios restantes para pleitear judicialmente a exclusão. No caso da decretação da falência ou liquidação da quota de sócio por credor particular, a exclusão do mesmo se dará de pleno direito. A liquidação das quotas se dá através da apuração de haveres, que significa a verificação do saldo existente para ser repassado ao sócio que vai deixar a sociedade. A verificação desse montante levará em consideração a situação financeira da sociedade na data em que houve a dissolução parcial, ou seja, a saída daquele sócio. Essa verificação levará em conta todo o patrimônio real da sociedade. Uma vez constatado o valor, haverá redução no capital social, e o montante será pago ao sócio que sai da sociedade em dinheiro, no prazo de 90 (noventa) dias da liquidação. Mas será garantido aos demais sócios a possibilidade suprirem o valor da quota liquidada, de modo a evitar a redução do capital social.
Dissolução total da sociedade
A dissolução total da sociedade se dará quando ocorrer uma causa que pode levar à extinção da pessoa jurídica. Há dois tipos de dissolução total: de pleno direito e a judicial. As causas de dissolução de pleno direito se encontram no art. 1.033 do CC e são cinco hipóteses:
- Vencimento do prazo de duração. Ainda que a sociedade seja com prazo certo, pré-estabelecido, se não houver oposição dos sócios, esta se prorrogará por prazo indeterminado, ocorrendo o que se convencionou chamar de prorrogação automática.
- Consenso unânime dos sócios. Independente do prazo de duração da sociedade, seja determinado ou indeterminado, quando a vontade de todos os sócios for de extinguir a pessoa jurídica, haverá a dissolução da sociedade.
- Deliberação dos sócios, por maioria absoluta, na sociedade de prazo indeterminado. A doutrina e a jurisprudência criticam essa possibilidade pois deve sempre ser buscada a continuidade da empresa e da sociedade, e no caso, se for da vontade de determinados sócios a dissolução, podem estes utilizarem da dissolução parcial, não havendo necessidade de se extinguir por completo a sociedade.
- Falta de pluralidade de sócios, não reconstituída no prazo de cento e oitenta dias. Na legislação anterior quando a sociedade se encontrava com um único sócio, a mesma era dissolvida. Em virtude do princípio da conservação da empresa, admite-se que a sociedade permaneça transitoriamente com apenas um sócio, mas desde que seja no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias.
- Extinção na forma da lei, de autorização para funcionar. Quando a autorização para o funcionamento da sociedade for revogada ou passar o prazo delimitado, a sociedade não poderá exercer a mesma atividade. A autorização de funcionamento é condição sem a qual a sociedade não pode existir, motivando, assim, sua dissolução.
Vale ressaltar que uma vez verificada essa hipótese o Ministério Público é parte legítima para pedir a liquidação da sociedade, se depois de 30 (trinta) dias não tiver sido tomada essa atitude pela própria sociedade. Se o MP se mantiver inerte após 15 (quinze) dias da comunicação da dissolução, a autoridade competente também poderá tomar providências que resultarão na liquidação da sociedade. Já o art. 1.034 do CC dispõe sobre as causas de dissolução total da sociedade por via judicial. São duas causas principais, que podem ser alegadas por qualquer sócio:
- Quando for anulado o ato de constituição da sociedade. Nesse caso está-se diante da possibilidade de dissolução judicial por vício no próprio contrato, ato de constituição da sociedade. Importante lembrar que, quando há a celebração de determinado negócio jurídico, as partes devem ser capazes, o objeto deve ser lícito e ainda que se componha da forma prescrita ou não proibida pela lei. Outros vícios possíveis são os aqueles provenientes do consentimento: erro, dolo, coação, simulação ou fraude. Importante lembrar que há prazo para requerer a anulação do ato de constituição da sociedade, que será de três anos, contados do registro efetuado.
- Exaurido o fim social, ou verificada a sua inexequibilidade. Nesse caso, a dissolução pode ser pedida quando a existência da pessoa jurídica se deu unicamente para o cumprimento de determinado objetivo, que já fora atingido ou então, quando se verifica a impossibilidade de se atingir a finalidade pretendida.
Importante mencionar ainda que o contrato social também poderá prever outras hipóteses de dissolução da sociedade, que serão devidamente comprovadas perante o juiz quando se verificar a ocorrência de uma das hipóteses acordadas, conforme anuncia o art. 1.035 do CC:
Código Civil - art. 1.035. O contrato pode prever outras causas de dissolução, a serem verificadas judicialmente quando contestadas.
Observação: uma vez decretada a dissolução da sociedade, passa-se à liquidação, ato necessário para a apuração do patrimônio social, eventuais débitos e créditos. Dessa forma, os administradores da sociedade elegem o liquidante, que irá gerir esse procedimento, sendo autorizado ao mesmo efetuar apenas negócios inadiáveis. Caso o liquidante efetue outras operações, ele será responsabilizado solidária e ilimitadamente pelas obrigações assumidas.

Referencial Teórico
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial, volume 1 : direito de empresa / Fábio Ulhoa Coelho. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
GONÇALVES, Maria Gabriela Venturoti Perrotta Rios e Gonçalves, Victor Eduardo Rios Gonçalves. Direito comercial: direito de empresa e sociedades empresárias. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. (Coleção sinopses jurídicas; v. 21)
RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito empresarial esquematizado. Rio de Janeiro: Forense. São Paulo: MÉTODO. 2010.

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