UNIVERSIDADE ESTADUAL DE RORAIMA
BACHARELADO EM DIREITO
DIREITO CIVIL – V PROFESSOR: PIERRE CASTRO
ALUNOS: ADELSON PEREIRA; FRANCISCO SEIXAS; THIAGO GARCIA.
BACHARELADO EM DIREITO
DIREITO CIVIL – V PROFESSOR: PIERRE CASTRO
ALUNOS: ADELSON PEREIRA; FRANCISCO SEIXAS; THIAGO GARCIA.
ENFITEUSE
Boa Vista, 28 de novembro de 2012
CONCEITO
Enfiteuse é o direito real que confere
ao seu titular (enfiteuta ou foreiro) a posse, o uso e gozo de imóvel alheio,
alienável, o qual se obriga a pagar ao titular do domínio da coisa (senhorio
direto) uma pensão anual invariável (foro). A enfiteuse deriva diretamente
do arrendamento por prazo longo ou perpétuo de terras públicas a particulares.
ORIGEM
O
instituto da enfiteuse teve sua origem na Grécia no séc. V a.C., mais somente
no Império Romano a enfiteuse se teve como um arrendamento perpétuo realizado
pelos Municípios e pelas corporações sacerdotais dotando ao arrendatário na
posse do imóvel e na faculdade de utilizar todos seus frutos e produtos. Era
também a prestação de serviços por parte do concessionário numa influência
francamente feudal, utilizado como instrumento jurídico capaz de tornar
produtivas grandes extensões de terras e fixar populações nessas regiões.
O
arrendamento era feito por particulares contra o pagamento de uma taxa anual
denominada Vectigal, no qual os prazos se entendiam por 100 anos ou mais (Ius
emphytuticum), ou perpetuo (Ius Perpeturium). A partir do século III d.C,
passaram a ser concedidas a particulares mediante pagamento de um foro anual
(cânon) que eram terras incultas pertencentes à família imperial destinadas ao
cultivo.
INSTITUIÇAO NO BRASIL
O
sistema da enfiteuse começou durante o período colonial com a coroa portuguesa,
pois diante da existência de largas áreas de terras abandonadas em seu
território, decidiu utilizar compulsoriamente o aforamento, através do instituto
das sesmarias, segundo o qual o proprietário do solo tinha de aceitar a
presença em suas terras de lavradores que iriam utilizá-las mediante
remuneração. O sesmeiro, autoridade pública em Portugal, distribuía e
fiscalizava as terras incultas.
Historicamente
a enfiteuse teve como objetivo permitir que o proprietário que não desejasse ou
pudesse utilizar o imóvel de maneira direta, pudesse ceder a outro o uso e o
gozo da propriedade. No Código Civil do Império foi regulado o aforamento nos
arts 605 a 649. No Brasil no código civil de 1916 regulou-se nos art's 678 a
694, que permanecem em vigor em face de regra de direito intertemporal
constante no artigo 2038 caput do Código Civil de 2002.
O
direito brasileiro, não admitiu a enfiteuse por prazo certo, ou por vida, ou
vidas. Garantiu-lhe perpetuidade o art. 679 do Código Civil, ainda que tal
caráter possa parecer contraditado pelo art. 693, que admitiu o resgate.
Essa
perpetuidade sempre foi vista como um verdadeiro atavismo jurídico, contra a
qual a razão e a justiça sempre puseram restrições.
NATUREZA JURÍDICA
A Constituição
Federal de 1988, veio abrir uma possibilidade para o legislador ordinário
extinguir a enfiteuse, conforme o artigo 49 das suas Disposições Transitórias:
"A lei
disporá sobre o instituto da enfiteuse em imóveis urbanos, sendo facultada aos
foreiros, no caso de sua extinção, a remição dos aforamentos mediante aquisição
do domínio direto, na conformidade do que dispuserem os respectivos
contratos."
Com a aprovação
do atual Código Civil Brasileiro, que passou a vigorar em 11 de Janeiro de
2003, a enfiteuse deixou de ser disciplinada e foi substituída pelo Direito de
Superfície. O artigo 2.038 do Código proíbe a constituição de novas enfiteuses
e subenfiteuses, subordinando-se as existentes, até sua extinção, aos
princípios do Código Civil de 1916.
Pode-se afirmar que o atual desinteresse do instituto deve-se ao
desaparecimento de grandes porções de terra desocupadas e à valorização das
terras, independentemente da inflação, e à impossibilidade do aumento do foro,
ressaltando-se que os novos problemas de ocupação do solo improdutivo no país
têm sido enfrentados com outros meios jurídicos. Contudo, poucas são as
legislações que ainda abrigam esse arcaísmo histórico e o Brasil caminha para a
sua total extinção.
Quanto à natureza, a enfiteuse é o mais amplo direito real sobre coisa
imóvel alheia, já que com ela se pode tirar da coisa todas as utilidades e
vantagens que encerra e de empregá-la nos misteres a que, por sua natureza, se
presta, sem destruir-lhe a substância e com a obrigação de pagar ao proprietário
uma certa renda anual.
Só pode ter objeto coisa imóvel, limitando-se a terras não cultivadas e
aos terrenos que se destinem à edificação; pode ter por objeto terrenos de
marinha e acrescidos.
OBJETO
Conforme
se extrai dos arts. 678 e
680 do
já revogado Código Civil de 1916, o objeto da enfiteuse é somente coisa imóvel,
limitando-se a terras não cultivadas e terrenos que se destinem a edificação.
Podem ser objeto também, os terrenos de marinha e acrescidos, sendo regulado
por lei especial, conforme dispõe o art. 2.038, §2 do atual Código Civil.
Os
terrenos de marinha são os terrenos que margeiam o mar, rios e lagos onde
exista influencia da maré e pertencem ao domínio direto da União, sendo
considerados bens dominicais da união, conforme o art. 20, VII, da CF/88, ou
seja, representam o patrimônio disponível do Estado. O Decreto-Lei n. 4.120/42
prevê que os terrenos de marinha se estendem até 33m da preamar média do ano de
1831. Preamar média é a media das marés altas (cheias) no período de um ano,
assim tomando como base a do ano de 1831, os terrenos de marinha vão até 33m
deste ponto.
Para
que seja concedido o aforamento dos terrenos de marinha é necessária
autorização administrativa da união, que é quem possui o domínio sobre os bens.
Conseguida esta autorização é necessário o pagamento do foro, também chamado de
canon ou pensão, para o concedente (a
união) que será proporcional ao do domínio pleno. Caso o foreiro queira alienar
seu direito é imprescindível à autorização prévia da união, e o pagamento do
laudêmio, que é uma porcentagem sobre o negócio realizado, sendo fixado por
lei, sobre o valor do terreno e suas acessões.
No
entanto o art. 2098, §1, I, do CC veda a cobrança do laudêmio tendo apenas duas
exceções, uma prevista no art. 22 da lei 9.514/97 e outra, que é a mais
importante, no Decreto-Lei nº 1.876/81. Esta ultima trata da isenção do
pagamento de foros e laudêmios referentes a imóveis de propriedade da união, as
pessoas consideradas carentes ou de baixa renda, cuja situação econômica não
lhes permita pagar esses encargos sem prejuízo do sustento próprio ou de sua
família. Pessoa de baixa renda é aquela cuja renda familiar não passa de 5
(cinco) salários mínimos, devendo ser comprovada a cada 4 anos para que
continue a fruir do beneficio da isenção.
Não
se deve esquecer, conforme já exposto, que os terrenos de marinha são regulados
por lei especial, por isso tem tratamento diferenciado do previsto no Código
Civil.
CONSTITUIÇÃO
DE ENFITEUSES
A constituição de novas enfiteuses é vedada pelo art.
2.038 do CC/02, in verbis:
Art.
2.038. Fica proibida a constituição de enfiteuses e subenfiteuses,
subordinando-se as existentes, até sua extinção, às disposições do Código Civil
anterior, Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916, e leis
posteriores.
Anteriormente era possível a constituição de enfiteuses
por ato inter vivos ou causa mortis, conforme o art. 678, CC/16. No primeiro
caso, era necessário que o ato constitutivo fosse feito por escritura publica,
por se tratar de bem imóvel, e que fosse devidamente registrado em cartório de
imóveis competente.
Previa o art. 858, do CC/16, que “a
transcrição do título de transmissão do domínio direto aproveita ao titular do
domínio útil, e vice-versa”. Assim, o ato de registo do direito do foreiro realizaria
também o do direito do outro, devido à inseparabilidade dessas relações
jurídicas.
A respeito do tema, explica Maria
Helena Diniz que:
“(...)
no contrato enfiteutico, as partes não tinham liberdade onímoda para estipular
clausulas que contrariassem os caracteres essenciais da enfiteuse, podiam
apenas alterar ou suprimir os efeitos naturais desse direito real, como o
direito ao laudêmio, por exemplo.”
A
enfiteuse por ato causa mortis, ou seja, por testamento ou ato de ultima
vontade, poderia ocorrer, por exemplo, quando o testador transmitisse o domínio
direto a um herdeiro e o domínio útil a outro, não sendo necessária a inscrição
em cartório, por se tratar de sucessão (meio aquisitivo de direito real).
Por
último, a enfiteuse poderia ser adquiria também por meio de usucapião, sendo a
sentença judicial que a declarasse serviria como titulo a ser registrado na
circunscrição imobiliária competente.
Um
exemplo prático seria a hipótese de alguém possuísse o bem aforado, como enfiteuta,
embora sem esse título, mas pagando o foro ao dono (usucapião extraordinária em
20 anos).
ANALOGIA COM OUTRO INSTITUTOS
A
enfiteuse poderia ser facilmente confundida com os institutos do usufruto e da
locação, porém existem traços distintivos que merecem destaque.
Maria
Helena Diniz citando Lafayette coloca em linhas gerais as seguintes diferenças: no caso do usufruto: a) trata-se
de um instituto com menos abrangência que a enfiteuse, pois neste último caso o
foreiro pode inclusive transformar o imóvel, desde que não o deteriore; b) a
enfiteuse pode ser transmitida causa mortis, o que não ocorre no caso do
usufruto; c) a enfiteuse pode ser alienada, situação incabível no usufruto,
podendo somente ser cedido, seja a titulo gratuito ou oneroso; d) para a
continuidade da enfiteuse é necessário o pagamento do foro, já o direito do
usufrutuário é gratuito; e) a enfiteuse é perpetua, recaindo sobre bem imóveis,
o usufruto é temporário, podendo recair tanto sobre bens móveis como imóveis.
Já
em relação à locação tem-se as seguintes diferenças: a) Igualmente ao usufruto,
a locação é temporária, enquanto a enfiteuse é perpetua; b) os direitos do
foreiro são mais extensos do que do locatário, no caso da enfiteuse o foreiro é
titular de um direito real, já no caso da locação o locatário é titular de um
direito pessoal; c) na enfiteuse o foreiro pode inclusive alienar o bem objeto
da enfiteuse, o que não ocorre na locação, sendo vedado ao locatário ceder ou
transferir o contrato de locação sem autorização, por escrito, do locador.
DIREITOS
E DEVERES DO ENFITEUTA
Sobre
a epígrafe dos direitos reais sobre coisas alheias, o Código Civil, do qual não
se afasta o mais recente ordenamento, trata de duas categorias de direitos
sobre coisas alheias: de gozo ou fruição e de garantia. Os de gozo ou fruição
permitem a utilização da coisa de forma semelhante ao proprietário pleno, com
maior ou menor espectro e a essa pertence a enfiteuse e passaremos agora a
explicitar quais vantagens e oubrigações, tanto do enfiteuta quanto do
proprietário direto.
O
enfiteuta possui o domínio útil da propriedade, ou seja, poderá usar, gozar e
dispor dos limites concedidos por tal direito, podendo receber frutos e
rendimentos. Em seu uso, não pode destruir-lhe a substancia, que pertence ao
senhorio.
O
enfiteuta pode usar, gozar e dispor dos limites concedidos por tal direito,
podendo receber os frutos e rendimentos do bem, tendo, nas palavras do saudoso
professor Silvio Venosa, uma “quase propriedade”. Quanto ao uso, não pode ele destruir
lhe a substancia, que pertence ao senhorio. Em relação à disposição, deverá ele
avisar o senhorio, pois este tem direito de preferência na aquisição, o qual
não exercido no prazo de 30 dias da notificação, terá o mesmo direito ao
laudêmio. Também é direito do enfiteuta, resgatar a enfiteuse, obtendo a
propriedade plena, 10 anos após a constituição do emprazamento, mediante
pagamento de um laudêmio, que será de 2,5% sob o valor atual da propriedade
plena, de 10 pensões anuais pelo foreiro (art. 693. CC/1916).
O
enfiteuta poderá gravar com hipoteca o imóvel, estabelecer servidões e
usufruto, os quais ficam subordinados à extinção, na hipótese de se extinguir o
aforamento, pois esses direitos, como regra, não atingem ao senhorio.
O
enfiteuta tem a obrigação de pagar ao senhorio uma pensão anual, também chamado
cânon ou foro e falta de pagamento do foro por três anos consecutivos acarreta
o comisso, que é a uma forma de extinção da enfiteuse. Também terá que arcar
com os impostos e com o ônus real da propriedade por ser ele o que usufrui o
bem
O
direito de preferência também é assegurado ao enfiteuta, no caso de querer o
senhorio vender o domínio direto, devendo, pois, ser também interpelado a
exerce-lo.
DIREITOS E DEVERES DO SENHORIO
DIREITOS E DEVERES DO SENHORIO
O
senhorio tem o direito de preferência em caso de venda ou dação em pagamento
pelo enfiteuta, e caso não exerça esse direita, lhe é assegurado o laudêmio,
que será de 2,5% sobre o preço da alienação, quando não exercer o direito de
preferencia. Também possui o direito de arrematação preferencial em caso de
igualdade de condições quando o bem for leiloado. Tem ainda o senhorio o
direito de invocar os direitos reais e pessoais, sendo estes representados
pelas ações de reivindicação, confessória e negatória e comisso, este ultimo de
caráter pessoal.
Quanto
aos deveres, tem- se o de respeitar o domínio útil do foreiro, o de notificar o
enfiteuta quando for alienar o seu domínio e o de conceder o resgate nos termos
do contrato.
EXTINÇÃO
DA ENFITEUSE
Extingue-se o
direito real limitado quando um ou outro titular do direito sobre a coisa o adquire
do outro, consolidando-se a propriedade plena para o enfiteuta ou para o
senhorio. Aduz o art. 692 do Código Civil de 1916:
“Extingue-se a enfiteuse:
I- pela natural deterioração do prédio aforado, quando chegue a não valer o capital correspondente ao foro e mais um quinto deste
II- pelo comisso, deixando o foreiro de pagar as pensões devidas, por 3 anos consecutivos, caso em que o senhorio o indenizará das benfeitorias necessárias.
III- falecendo o enfiteuta, sem herdeiros, salvo o direito dos credores
Outras também podem ser as causas de extinção da enfiteuse, como a renúncia, o abandono, a confusão, bem como as demais causas de extinção da propriedade.
O
lei limitou os casos de extinção da enfiteuse a esses, mas outros podem ser
aplicados que é primeiramente a aquisição por alienação ou arremate pelo
enfiteuta ou pelo senhorio da “parte” da propriedade que ainda não lhe pertence,
ocorrendo assim a confusão dessas qualidades. Outro caso de extinção seria a
renúncia do senhorio ou o abandono pelo enfiteuta do imóvel, não restando outra
alternativa senão extinguir o seu direito.
Com
relação aos casos mencionados na lei, o que se refere ao comisso vale especial
atenção, pois, é pacifico na
jurisprudência que, para que ocorra a extinção do direito é necessária uma
decisão judicial nesse sentido, atendendo, é claro, o requisito dos 03 anos sem
pagamento do foro, podendo o enfiteuse purgar a mora até a decisão final.
E
por fim, pode ocorrer a usucapião do imóvel por terceiro estranho à relação,
devendo, portanto, haver uma inércia, tanto do foreiro quanto do proprietário
direto.
CONCLUSÃO
Diante do exposto, conclui-se que a enfiteuse é
um direito real em extinção no nosso ordenamento jurídico, não podendo ser
constituída novas enfiteuses a partir da vigência do Novo Código Civil, sendo
resguardadas as já existentes, em decorrência ao direito adquirido.
Tal instituto merece ainda ser estudado para a
aquisição de conhecimento que poderão ser utilizados para a solução de empasses
jurídicos futuros no nosso direito.
É considerada uma “velharia jurídica” por alguns autores, que já cumpriu o papel em seu tempo, mas que as demandas atuais não mais a pedem.
É considerada uma “velharia jurídica” por alguns autores, que já cumpriu o papel em seu tempo, mas que as demandas atuais não mais a pedem.
BIBLIOGRAFIA
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito civil brasileiro. 24ª edição, ed.
Saraiva, 2009 v. 4
VENOSA, Sílvio de Salvo.Direito Civil, Direitos Reais, Décima Edição,
Editora Atlas, 2010 v. 5
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro 4ª edição, ed.
Saraiva, 2009 v. 5
ROQUE, José Sebastião, Direito das Coisas, Coleção Elementos de Direito,
SP, Editora Ícone
PEREIRA, Caio Mario da Silva, Instituições de Direito Civil , Editora
Forense, 20ª edição, RJ, 2009
[1]
Art. 678. Dá-se a enfiteuse, aforamento, ou emprazamento, quando por ato entre
vivos, ou de última vontade, o proprietário atribui à outro o domínio útil do
imóvel, pagando a pessoa, que o adquire, e assim se constitui enfiteuta, ao
senhorio direto uma pensão, ou foro, anual, certo e invariável.
[2] Art. 680. Só podem ser objeto de
enfiteuse terras não cultivadas ou terrenos que se destinem a edificação.
[3]
Curso de Direito Civil Brasileiro, pg. 403.
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