quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

OS PODERES CONSTITUINTES


OS PODERES CONSTITUINTES
Thainá S. G. C. Farias
Kercya M. M. Cavalcante
Jean Daniel Santos
André Nentwig Silva[1]

O presente estudo procura demonstrar a evolução do Poder Constituinte, abordando pontos básicos, além de descrever sobre suas subdivisões, e o período histórico com o qual aparecem os primeiros alicerces de uma reforma judiciária.
 Na Antiguidade surge a primeira intenção de organização de uma Nação, que aflorou a ideia de serem fundamentais normas que auxiliam a estrutura de um Estado. Na Idade Média, temos na França feudal, a implantação de dinastias merovíngia, carolíngia, que possuíam o poder e ditavam regras, sobre todos os cidadãos da antiga França. Nesta época, tem-se a importante reforma judiciária, que fortaleceu o poder real, dando início ao Absolutismo em toda a Europa. Contudo, não havia ainda uma ideia pré-formulada em relação ao Poder Constituinte, pois esta está associada à Constituição escrita. Portanto, ocorreram muitas manifestações colocando as leis fundamentais da estrutura de um Estado em campo superior, este ao lado das leis ordinárias. No entanto, somente na Idade Moderna, formularam-se normas superiores produzidas por um poder destinado a construir a sociedade politica, até porque as normas antes formuladas eram apenas costumeiras ou oriundas do Direito Natural. Assim, com os objetivos de limitar o poder absoluto dos reis, as revoltas elaboradas por classes inferiores tornaram possível que o Poder Constituinte tivesse força, na tentativa de criar um verdadeiro Estado organizado politico e juridicamente, logo superando o antigo regime Absolutista.
Com a Revolução Francesa, no final do séc. XVIII surge uma doutrina acerca do Poder Constituinte, elaborada por Joseph Sieyes, obra conhecida como “A Constituinte Burguesa”.  Obra desenvolvida para legitimar a Nação, mudando os alicerces do campo politico e juridico. Embora outros pontos históricos como a Revolução Americana, o Constitucionalismo Inglês, que também colaboraram com o nascimento do novo Poder. Porém foi na França que essa fase se concretizou.
 
Poder Constituinte Originário
 
            Diz-se poder constituinte originário aquele que inaugura uma nova ordem jurídica, estabelecendo um novo Estado, uma nova constituição, rompendo, assim, com todo ordenamento jurídico anterior.
            É um poder essencialmente político, não se prende a limites formais, tem objetivo único de criar um novo Estado, uma nova ordem jurídica, como podemos observar na lição de Luiz Alberto David Araújo “o Poder Constituinte Originário é um poder político que impõe um poder jurídico: a Constituição”.
            A doutrina nos traz uma subdivisão do poder constituinte originário em: Histórico e Revolucionário. Histórico é aquele que inaugura a primeira constituição, instalando pela primeira vez, o Estado. Revolucionário, são todos aqueles que sucedem o histórico, é aquele que rompe por completo com a ordem jurídica anterior, instaurando uma nova ordem jurídica, um novo Estado, uma nova Constituição.
O Poder Constituinte Originário se expressa de duas formas: por Outorga ou por Assembleia Nacional Constituinte ou Convenção.
Vejamos na lição de Alexandre de Moraes:

“A outorga é o estabelecimento da constituição por declaração unilateral do agente revolucionário, que autolimita seu poder. (Exemplos: Constituições de 1824, 1937 e Ato Institucional nº 1, de 9-4-1964.)”

“A assembleia nacional constituinte, também denominada convenção, nasce da deliberação da representação popular, devidamente convocada pelo agente revolucionário, para estabelecer o texto organizatório e limitativo de Poder. (Exemplo: Constituições de 1891, 1934, 1946, 1967 e 1988.)” (MORAES, 2009, p. 28).


            Passemos então para a apresentação das características do poder constituinte originário, a doutrina majoritária apresente as seguintes: inicial, autônomo, ilimitado juridicamente e permanente.
            I – inicial: o poder constituinte originário inaugura um novo sistema jurídico, um novo Estado, tem o poder de revogar a ordem anterior e todas normas contrárias a nova ordem fundamental;
            II – autônomo: possui autonomia para estruturar a nova constituição, pois não está vinculado ao sistema jurídico anterior;
            III – ilimitado juridicamente: não se condiciona formalmente ao ordenamento jurídico anterior, não existe limitação jurídica ao seu exercício, ou seja, é um poder de fato;
            IV – incondicionado: não se submete a nenhum processo predeterminado para sua elaboração.
            Sintetizando, Alexandre de Moraes, em sua obra, citando Canotilho diz:

         “o poder constituinte, na teoria de Sieyès, seria um poder inicial, autônomo (sic) e omnipresente (sic). É inicial porque não existe, antes dele, nem de facto (sic) nem de direito, qualquer outro poder. É nele que se situa, por excelência a vontade do soberano (instância jurídico-política dotada de autoridade suprema). É um poder autônomo: a ele e só a ele compete decidir se, como e quando, deve ‘dar-se’ uma constituição à Nação. É um poder omnipresente (sic), incondicionado: o poder constituinte não está subordinado a qualquer regra de forma ou de fundo”. (MORAES, 2009, p.28)


            Contudo, o prof. Pedro Lenza ainda nos traz outras características quais sejam:
            Permanente: o poder originário, conforme Lenza, “não se esgota com a edição da nova Constituição”, ela sobrevive “como forma e expressão da liberdade humana, em verdadeira ideia de subsistência”. O referido professor traz a baila lição de Manoel Gonçalves Ferreira Filho:

“essa característica decorre de fórmula clássica prevista no art. 28 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, editada como preâmbulo da Constituição francesa de 1793 e “... no sentido de que o homem, embora tenha tomado uma decisão, pode rever, pode mudar posteriormente essa decisão...”.4 Isso não significa que o poder constituinte originário permanente e “adormecido” sairá desse estado de “hibernação” e de “latência” a todo e qualquer o momento, até porque instauraria indesejada insegurança jurídica. Para tanto, deve haver o “momento constituinte”, uma situação tal que justifique e requeira a quebra abrupta da ordem jurídica”. (LENZA, 2011, p. 470)

            Formal: explica Lenza, que: “é o ato de criação propriamente dito e que atribui a “roupagem” com status constitucional a um complexo normativo”. 
            Material: é o lado substancial, que qualifica o direito constitucional formal como status de norma constitucional. Na lição do professor temos que: “O material diz o que é constitucional; o formal materializa e sedimenta como constituição”. (LENZA, 2011, p. 471)
            Nesta senda, anota Jorge Miranda:

“o poder constituinte formal confere “... estabilidade e garantia de permanência e de supremacia hierárquica ou sistemática ao princípio normativo inerente à Constituição material”. Confere estabilidade, visto que a certeza do Direito exige o estatuto da regra. Confere garantia, visto que só a Constituição formal coloca o poder constituinte material (ou o resultado da sua acção) ao abrigo das vicissitudes da legislação e da prática quotidiana do Estado e das forças políticas”. (MIRANDA, 2007, p. 91-92)


            No entanto, existem correntes doutrinárias que afirmam que o poder constituinte originário não é totalmente autônomo e independente, os jusnaturalista defendem que o Poder Constituinte Originário deve respeito às normas de direito natural.

            Afirmam que o que existe é uma ausência de vinculação jurídico-positivo, pois, o poder originário não tem seu exercício ligado por normas jurídicas dos sistemas anteriores, no entanto, não podemos afirmar que este poder possa ser arbitrário, absoluto sem qualquer limitação, conforme Lenza, citando J. H. Meirelles Teixeira, diz: “Ao contrário, tanto quanto a soberania nacional, da qual é apenas expressão máxima e primeira, está o Poder Constituinte limitado pelos grandes princípios do Bem Comum, do Direito Natural, da Moral, da Razão”. (LENZA, 2011, p. 472)
            Essa tese defende está limitação, tendo em vista dar legitimidade ao poder constituinte originário, pois não se pode num sistema em evolução, deixar-se retroceder aos tempos remotos, principalmente, por defesa aos direitos humanos, por princípios de direito internacional, a qual a ordem jurídica internacional confere esses direitos a todo ser humano, não os limitando a uma determinada parcela da sociedade, trata-se aqui, do princípio da vedação ao retrocesso, ou efeito “cliquet”.
            Temos ainda a visão positivista que defende que tal poder está limitado pela norma hipotética fundamental, que a nosso ver trata-se da legitimidade do direito positivo, ou seja, são os valores e princípios que uma sociedade confere ao poder para elaborar sua norma jurídica fundamental, trata-se de uma afirmação um tanto quanto naturalista, tendo em vista que a norma hipotética fundamental não está positivado em nenhum ordenamento jurídico.
            Logo, se o poder constituinte originário defende a vontade política da nação, ele não pode se afastar dos valores éticos, religiosos, culturais que a impulsionam, se o poder constituinte se afasta dessas prerrogativas não terá reconhecimento jurídico-político, tendo vista que o povo, detentor deste poder não o reconhecerá. Assim, para que se efetive esse poder é preciso ter a anuência do povo, ou seja, deve haver a ratificação por parte deste. Pois, é este que confere poderes de validade no âmbito nacional e internacional.
 
Poder Constituinte Constituído (Derivado)

Conforme o que nos ensina o autor Constitucionalista Paulo Bonavides, em seu critério de distinção entre o poder constituinte originário do poder constituinte constituído ou derivado:
“Costuma-se distinguir o poder constituinte originário do poder constituinte constituído ou derivado. O primeiro faz a Constituição e não se prende a limites formais: é essencialmente político ou, se quiserem, extrajurídico. O segundo se insere na Constituição, é órgão constitucional, conhece limitações tácitas e expressas, e se define como poder primacialmente jurídico, que tem por objeto a reforma do texto constitucional. Deriva da necessidade de conciliar o sistema representativo com as manifestações diretas de uma vontade soberana, competente para alterar os fundamentos institucionais da ordem estabelecida”

 Esse Poder também é denominado de poder instituído, constituído, secundário ou poder de 2º grau. É constituído, pois, sempre se desenvolve junto à sociedade. Desta forma, temos a Constituição não como um sistema fechado. Este age de forma solene, conforme regras estabelecidas pela própria constituição.
 Ao Poder Constituinte é instituído três características, que são: derivação, condicionalidade e subordinação. A primeira origina-se da Constituição, na qual se funda. Sua força, como deixa claro Ferreira Filho afirmando que "não provêm de si próprio, mas do poder constituinte originário, sendo por ele criado. Tendo em vista ser um poder derivado, sofre restrições, estando condicionado e subordinado ao seu criador".
Tendo como prerrogativas a necessidade de manter atualizada do ponto de vista do acompanhamento das evoluções históricas, sociais, políticas e econômicas, o poder derivado ou constituído não nasce como um sistema fechado, sendo dividido em três esferas descritas abaixo:
O poder constituinte derivado decorrente: aplicável a constituições Estaduais, do Distrito Federal e dos Municípios. Não altera a constituição, estabelece a lei maior, como citados nos Arts. 25 e 29 da CF/88, e vide a Súmula 681 do STF. Como abaixo o art. 25 CF/88:
“Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição”.
           
Observa-se que os Estados são autônimos uma vez que possuem capacidade de auto-organização, autogoverno, auto-administração, mas não são soberanos, pois devem obedecer a Constituição. Desta forma, o poder constituinte decorrente também encontra limitações.
Foi criado pelo poder constituinte originário. É o poder de que foram investidos os estados-membros para elaborar a sua própria constituição (capacidade de auto-organização).
O exercício do poder constituinte decorrente foi conferido às Assembléias legislativas. “Cada Assembleia Legislativa, com poderes constituintes, elaborará a Constituição do Estado, no prazo de um ano, contando da promulgação da Constituição Federal, obedecidos os princípios desta” (art. 11 dos ADCT) (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), sendo que:
Parágrafo único. Promulgada a Constituição do Estado, caberá à Câmara Municipal, no prazo de seis meses, votar a Lei Orgânica respectiva, em dois turnos de discussão e votação, respeitado o disposto na Constituição Federal e na Constituição Estadual.
O poder constituinte derivado revisor: possui limitação temporal disposto no art. 3º do ADCT :
Art. . A revisão constitucional será realizada após cinco anos, contados da promulgação da Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral.
            No entanto é a constituição que dita como este poder atua, sendo este limitado material e formalmente.
O poder constituinte derivado reformador: acontece de maneira que deve seguir um rito, possui limites, sendo estabelecida com o intuito de adequar a Constituição à realidade que a sociedade apontasse como necessária.
Na maior parte dos países o Poder Constituinte tem sido exercido por grupos autocráticos, ou seja, sem a participação do povo. Pois existem duas formas de exercício deste poder:
a) Assembleia Nacional Constituinte, forma esta que teve origem nos Estados Unidos, no ano de 1787.
b) O Referendo – Que o direito que assiste a qualquer cidadão que se representa através do voto, sobre questões de alta relevância, aprovando-as ou revogando-as.

Poder constituinte difuso

É um poder político que se manifesta com o objetivo de não ocorrer à petrificação do texto constitucional, logo é responsável pela interpretação e mutação constitucional de acordo com a realidade e as necessidades sociais vividas no momento.
Atua de maneira informal, diferentemente do poder constituinte derivado reformador.  Para Pedro Lenza: “a manifestação do Poder Constituinte Reformador verifica-se através das emendas constitucionais (arts. 59, I e 60 da CF/88)”.
Já o poder difuso é exercido pelas cortes constitucionais no caso do Brasil o Supremo Tribunal Federal é responsável por interpretar e alterar informalmente a Constituição.
Segundo Manoel Gonçalves Ferreira Filho “No plano constitucional não é difícil determinar a função do Supremo Tribunal Federal, pois ele é o supremo aplicador da lei e, portanto o mais alto servidor da justiça. Cabe-lhe assegurar rigorosamente a supremacia da Constituição, como fundamento da ordem jurídica”.
Há atualmente inúmeros questionamentos a cerca do poder “ilimitado” conferido a esse órgão e da possibilidade de ele ser um “poder moderador” que tem determinado o que é ou não constituição.
E por fim, o poder constituinte Supranacional, que é o poder de fato. É como uma “Constituição” universal que submete moralmente as demais constituições nacionais, e é caracterizada pelos tratados e acordos internacionais que pressionam os poderes originários aos seus conceitos universais.

“Poder Constituinte Supranacional é o poder que cria uma Constituição, na qual cada Estado cede uma parcela de sua soberania para que uma Constituição comunitária seja criada. O titular deste Poder não é o povo, mas o cidadão universal.” (Daniella Yoshikawa)

Considerações Finais

            Ao longo do trabalho observou-se as abordagens  histórica, politica e social de uma sociedade como sede de mudanças,  até o surgimento do Poder Constituinte e suas subdivisões. Além disso, mostrou-se que para a elaboração de uma Constituição suprema, de onde emana o Poder, é fundamental a inteiração desta com a sociedade, correlacionando a realidade e estabelecendo determinadas regras e princípios. Logo, o conteúdo dessa suprema norma evolui conforme o desenvolvimento de um nação, desde os primórdios.
[1] Acadêmicos de Direito da Universidade Estadual de Roraima
Referências Bibliográficas

BRASIL. Constituição Federal, de 05.10.88. Atualizada com as Emendas Constitucionais Promulgadas
BONAVIDES, Paulo, Curso de Direito Constitucional, 13ª ed., Malheiros
Curso de Direito Constitucional /Celso Ribeiro Batos. – 13ª. ed. Reform. de acordo com a constituição de 1988 – São Paulo : Saraiva, 1990.
Curso de Direito Constitucional / Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Junior. – 7ª. ed. Ver. E atual. – São Paulo : Saraiva, 2003.
Direito Constitucional / Alexandre de Moraes – 24ª. ed. – 2. Reimp. – São Paulo: Atlas, 2009.
Curso de Direito Constitucional / Paulo Bonavides – 26ª. ed. Atual. São Paulo : Malheiros, 2011.
Curso de Direito Constitucional/ Manoel Gonçalves Ferreira Filho - 30ª ed. 2003. São Paulo. Editora Saraiva

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