TRANSCONSTITUCIONALISMO
Aurélio de F. e Carvalho
Paula Adriana de S. Evangelista
O transconstitucionalismo
tem ganhado grande repercussão nas universidades mundo a fora. Este fenômeno
jurídico moderno se dá quando uma questão constitucional concreta é discutida simultaneamente
em Cortes Constitucionais de países distintos, ou ainda entre tribunais nacionais
e tribunais de Organizações Internacionais. Podemos encontrar designações de sinonímia
doutrinaria como cross-constitucionalismo, ou ainda fecundação cruzada. Essa teoria
foi proposta pelo professor Marcelo Neves e o nome que aparenta inicialmente sugerir
uma supraconstitucionalização internacional, propõe na verdade, um diálogo de
sistemas jurídico-constitucionais buscando o aprendizado e a validação de suas
decisões.
Não
se trata da criação de um metassistema jurídico, ou uma Constituição Mundial. O
transconstitucionalismo de Neves busca uma harmonização de decisões, tendo em
vista a particularidade da sociedade moderna, que é globalizada.
Podemos constatar
essa transversalidade, quando, por exemplo, o Supremo Tribunal Federal cita em
seus acórdãos algumas decisões de tribunais estrangeiros. Nesse sentido podemos
nos valer dos ensinamentos de Marcelo Dias Varella[1],
que ainda que falando sobre solução pacífica de controvérsia, vale-se da ideia de
transconstitucionalismo:
Isso ocorre não apenas entre os tribunais
internacionais, mas entre os nacionais e internacionais e mesmo entre os tribunais
nacionais entre si. Decisões da Corte Europeia de Direitos Humanos são comumente
citadas na Corte Interamericana de Direitos Humanos e vice-versa. Estas duas
servem de fonte para a Corte Internacional de Justiça e para o Órgão de Solução
de Controvérsias da Organização Mundial do Comércio. Os juízes da Suprema Corte
Americana preocupam-se com as repercussões de seus votos em outros tribunais
superiores de todo o mundo.
Marcelo Neves
supera a compreensão tradicional do constitucionalismo e do direito
internacional público, em sua obra não se preocupa em introduzir uma ideia que
precisa ser perseguida, na verdade, diz que a transversalidade já ocorre, porém
precisa ser trabalhada para que se aperfeiçoe.
Sua teoria se
justifica como já foi dito anteriormente pelo momento social global em que vive
a humanidade, donde impulsos provenientes de relações comerciais, culturais,
econômicas e tecnológicas diminuíram virtualmente as fronteiras entre os povos.
Tais impulsos trazem transformações significativas no mundo jurídico-político,
que deve se atualizar constantemente para atender essa nova demanda. Outro ponto
que parece favorecer esses diálogos transversais é a globalização dos direitos
humanos, ou direitos fundamentais.
Para o pesquisador Vitor Soliano[2] a
exemplo desta demanda global, temos os direitos humanos que irradiaram para
todo o mundo ocidental em países que adotam o modelo constitucionalista:
Ainda, observamos que o discurso
dos direitos humanos, que tem sua base idéia de proteção de direitos básicos,
se espalhou pelo mundo ocidental e passou a fazer parte das ordens
jurídico-estatais que assumem o modelo constitucionalista.
Não se trata,
pois, de hierarquização ou de superposição jurisprudencial, visto ocorrerem
paralelamente e simultaneamente de maneira não vinculativa, mantendo-se a
autonomia e autoafirmação jurídico-constitucional de cada estado. Tais feitos
ocorrem nos centros das ordens jurídicas (tribunais e juízes), independendo
desta forma de tratados convencionais internacionais. Ressalte-se que seu
principal centro são as Cortes Constitucionais, contudo, não se exaurem nelas.
Em consonância
com o artigo de Vitor Soliano que corrobora o que acima foi dito, como podemos
verificar no trecho de sua autoria:
Enfim,
reconhece-se que os problemas nucleares do constitucionalismo são debatidos por
diversas ordens jurídicas entrelaçadas, principalmente (mas não só) no interior
das Cortes Constitucionais.
A norma máxima
do poder soberano é a Constituição, sendo então soberana não há a necessidade de
reconhecimento formal de normas alheias ao seu próprio sistema (operacional). Essa
é escola clássica e predominante do Direito Constitucional. Apesar das Cortes
Constitucionais sempre terem feito referência às decisões de outros Tribunais,
sempre o fizeram como Direito Comparado, sem reconhecimento deôntico destas
decisões.
O transconstitucionalismo
versa sobre sistemas abertos, onde há não a obrigatoriedade supressiva
hierárquica de questões constitucionais, mas sim a complementação, uma
verdadeira conexão entre os sistemas jurídico-constitucionais visando o diálogo
entre tais instituições, diálogo no sentido de aprendizado, de construção, não
no sentido de conversação.
O transconstitucionalismo
de Marcelo Neves baseia-se na teoria dos sistemas. Utiliza a transversalidade
para assinalar um proceder de internalização recíproca realizado por sistemas
que agem de forma cooperativa. Evitando desta forma que a autonomia/soberania
não resulte em um encerramento dos referidos sistemas, em especial das novas e contemporâneas
demandas oriundas da sociedade globalizada.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
Leal, Eliane. Monografia - O TRANSCONSTITUCIONALISMO COMO CONDIÇÃO PARA INTEGRAÇÃO DOS DIREITOS
HUMANOS NA SOCIEDADE MULTICÊNTRICA: uma visão crítica. Disponível em:
Lenza, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado.
15ª ed. São Paulo. Saraiva, 2011.
Orrù, Romano. Informal judicial
cross fertilization and the system of Conferences between Constitutional Courts
and equivalent bodies. Disponível em:
Soliano,Vitor. Transconstitucionalismo,
Interconstitucionalidade e Heterorreflexividade: alternativas possíveis para a
proteção dos Direitos Humanos na relação entre ordens jurídico-constitucionais distintas
– primeiras incursões. Disponível em:
Varella, Marcelo
Dias. Direito internacional público.
3ª ed., São Paulo Saraiva, 2011.
[1] Varella (2011;433 e 434)
[2] Soliano, Vitor, Transconstitucionalismo,
Interconstitucionalidade e Heterorreflexividade: alternativas possíveis para a
proteção dos Direitos Humanos na relação entre ordens jurídico-constitucionais distintas
– primeiras incursões. Disponível em http://www.revistas.unifacs.br/index.php/redu/article/view/2147/1585.
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