quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

TRANSCONSTITUCIONALISMO


TRANSCONSTITUCIONALISMO

Aurélio de F. e Carvalho
Paula Adriana de S. Evangelista

O transconstitucionalismo tem ganhado grande repercussão nas universidades mundo a fora. Este fenômeno jurídico moderno se dá quando uma questão constitucional concreta é discutida simultaneamente em Cortes Constitucionais de países distintos, ou ainda entre tribunais nacionais e tribunais de Organizações Internacionais. Podemos encontrar designações de sinonímia doutrinaria como cross-constitucionalismo, ou ainda fecundação cruzada. Essa teoria foi proposta pelo professor Marcelo Neves e o nome que aparenta inicialmente sugerir uma supraconstitucionalização internacional, propõe na verdade, um diálogo de sistemas jurídico-constitucionais buscando o aprendizado e a validação de suas decisões.
Não se trata da criação de um metassistema jurídico, ou uma Constituição Mundial. O transconstitucionalismo de Neves busca uma harmonização de decisões, tendo em vista a particularidade da sociedade moderna, que é globalizada.
Podemos constatar essa transversalidade, quando, por exemplo, o Supremo Tribunal Federal cita em seus acórdãos algumas decisões de tribunais estrangeiros. Nesse sentido podemos nos valer dos ensinamentos de Marcelo Dias Varella[1], que ainda que falando sobre solução pacífica de controvérsia, vale-se da ideia de transconstitucionalismo:
Isso ocorre não apenas entre os tribunais internacionais, mas entre os nacionais e internacionais e mesmo entre os tribunais nacionais entre si. Decisões da Corte Europeia de Direitos Humanos são comumente citadas na Corte Interamericana de Direitos Humanos e vice-versa. Estas duas servem de fonte para a Corte Internacional de Justiça e para o Órgão de Solução de Controvérsias da Organização Mundial do Comércio. Os juízes da Suprema Corte Americana preocupam-se com as repercussões de seus votos em outros tribunais superiores de todo o mundo.

Marcelo Neves supera a compreensão tradicional do constitucionalismo e do direito internacional público, em sua obra não se preocupa em introduzir uma ideia que precisa ser perseguida, na verdade, diz que a transversalidade já ocorre, porém precisa ser trabalhada para que se aperfeiçoe.
Sua teoria se justifica como já foi dito anteriormente pelo momento social global em que vive a humanidade, donde impulsos provenientes de relações comerciais, culturais, econômicas e tecnológicas diminuíram virtualmente as fronteiras entre os povos. Tais impulsos trazem transformações significativas no mundo jurídico-político, que deve se atualizar constantemente para atender essa nova demanda. Outro ponto que parece favorecer esses diálogos transversais é a globalização dos direitos humanos, ou direitos fundamentais.
Para o pesquisador Vitor Soliano[2] a exemplo desta demanda global, temos os direitos humanos que irradiaram para todo o mundo ocidental em países que adotam o modelo constitucionalista:
Ainda, observamos que o discurso dos direitos humanos, que tem sua base idéia de proteção de direitos básicos, se espalhou pelo mundo ocidental e passou a fazer parte das ordens jurídico-estatais que assumem o modelo constitucionalista.

Não se trata, pois, de hierarquização ou de superposição jurisprudencial, visto ocorrerem paralelamente e simultaneamente de maneira não vinculativa, mantendo-se a autonomia e autoafirmação jurídico-constitucional de cada estado. Tais feitos ocorrem nos centros das ordens jurídicas (tribunais e juízes), independendo desta forma de tratados convencionais internacionais. Ressalte-se que seu principal centro são as Cortes Constitucionais, contudo, não se exaurem nelas.
Em consonância com o artigo de Vitor Soliano que corrobora o que acima foi dito, como podemos verificar no trecho de sua autoria:
Enfim, reconhece-se que os problemas nucleares do constitucionalismo são debatidos por diversas ordens jurídicas entrelaçadas, principalmente (mas não só) no interior das Cortes Constitucionais.
A norma máxima do poder soberano é a Constituição, sendo então soberana não há a necessidade de reconhecimento formal de normas alheias ao seu próprio sistema (operacional). Essa é escola clássica e predominante do Direito Constitucional. Apesar das Cortes Constitucionais sempre terem feito referência às decisões de outros Tribunais, sempre o fizeram como Direito Comparado, sem reconhecimento deôntico destas decisões.
O transconstitucionalismo versa sobre sistemas abertos, onde há não a obrigatoriedade supressiva hierárquica de questões constitucionais, mas sim a complementação, uma verdadeira conexão entre os sistemas jurídico-constitucionais visando o diálogo entre tais instituições, diálogo no sentido de aprendizado, de construção, não no sentido de conversação.
O transconstitucionalismo de Marcelo Neves baseia-se na teoria dos sistemas. Utiliza a transversalidade para assinalar um proceder de internalização recíproca realizado por sistemas que agem de forma cooperativa. Evitando desta forma que a autonomia/soberania não resulte em um encerramento dos referidos sistemas, em especial das novas e contemporâneas demandas oriundas da sociedade globalizada.

           
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Leal, Eliane. Monografia - O TRANSCONSTITUCIONALISMO COMO CONDIÇÃO PARA INTEGRAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS NA SOCIEDADE MULTICÊNTRICA: uma visão crítica. Disponível em: 


Lenza, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 15ª ed. São Paulo. Saraiva, 2011.

Orrù, Romano. Informal judicial cross fertilization and the system of Conferences between Constitutional Courts and equivalent bodies. Disponível em:

Soliano,Vitor. Transconstitucionalismo, Interconstitucionalidade e Heterorreflexividade: alternativas possíveis para a proteção dos Direitos Humanos na relação entre ordens jurídico-constitucionais distintas – primeiras incursões. Disponível em:

Varella, Marcelo Dias. Direito internacional público. 3ª ed., São Paulo Saraiva, 2011.




[1] Varella (2011;433 e 434)
[2] Soliano, Vitor, Transconstitucionalismo, Interconstitucionalidade e Heterorreflexividade: alternativas possíveis para a proteção dos Direitos Humanos na relação entre ordens jurídico-constitucionais distintas – primeiras incursões. Disponível em http://www.revistas.unifacs.br/index.php/redu/article/view/2147/1585.

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