sábado, 22 de setembro de 2012

POSSIBILIDADE DE COLIDÊNCIA ENTRE NOME EMPRESARIAL E MARCA.


É irrefutável no âmbito do Direito Empresarial que o nome empresarial e a marca consistem em elementos de identificação distintos. Sendo o primeiro, elemento que identifica a pessoa física (empresário individual) ou jurídica (sociedade empresarial) que exerce atividade econômica organizada com fins lucrativos, enquanto que o segundo identifica os produtos ou serviços. Compartindo das lições de Coelho (2011, p. 195), o doutrinador assevera que “se a marca identifica, direta ou indiretamente, os produtos ou serviços, o nome empresarial irá identificar o sujeito de direito que os fornece ao mercado”.
Não obstante, os designativos apresentem diferentes traços distintivos, especialmente no que concerne ao órgão em que são registrados, aos limites territoriais, materiais e temporais da tutela, ambos gozam de proteção legal que visa resguardá-los da usurpação e do erro do consumidor quanto à procedência do produto ou serviço.
Ao titular da marca o qual é concedido pelo INPI se confere proteção jurídica em todo território nacional, sendo regido pelo princípio da especialidade, como assevera André Luiz Santa Cruz Ramos (2010, p.215):
“Essa proteção conferida ao titular da marca, não obstante seja abrangente no que se refere ao seu âmbito territorial – vale em todo país, como visto – é restrita no que diz respeito ao seu âmbito material. Assim, diz-se que a proteção conferida à marca registrada se submete ao chamado princípio da especialidade ou especificidade.”
O art. 1.166 do Código Civil de 2002 assegura ao empresário proteção ao nome, de forma que é exclusivo o seu uso nos limites do respectivo Estado. Por sua vez, uma das condições impostas ao registro de marca é a novidade relativa do sinal distintivo, isto é, que a marca seja nacionalmente nova para o ramo de atividade econômica que explorar o seu titular.
Em face da proteção legal que gozam os designativos em estudo, pode-se indagar a respeito do conflito entre nome empresarial e marca?
Sendo a supracitada problemática objeto de recurso especial, o Superior Tribunal Justiça proferiu acórdão nos termos seguintes:
PROPRIEDADE INDUSTRIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. RECURSO ESPECIAL. PEDIDO DE CANCELAMENTO DE DECISÃO ADMINISTRATIVA QUE ACOLHEU REGISTRO DE MARCA. REPRODUÇÃO DE PARTE DO NOME DE EMPRESA REGISTRADO ANTERIORMENTE. LIMITAÇÃO GEOGRÁFICA À PROTEÇÃO DO NOME EMPRESARIAL. ART. 124, V, DA LEI 9.279/96. RECURSO PROVIDO, DECISÃO UNÂNIME 1. Apesar de as formas de proteção ao uso das marcas e do nome de empresa serem diversas, a dupla finalidade que está por trás dessa tutela é a mesma: proteger a marca ou o nome da empresa contra usurpação e evitar que o consumidor seja confundido quanto à procedência do produto. 2. A nova Lei de Propriedade Industrial, ao deixar de lado a linguagem parcimoniosa do art. 65, V, da Lei 5.772/71 – corresponde na lei anterior ao inciso V, do art. 124 da LPI -, marca acentuado avanço, concedendo à colisão entre nome comercial e marca o mesmo tratamento conferido à verificação de colidência entre marcas, em atenção ao princípio constitucional da liberdade concorrencial, que impõe a lealdade nas relações de concorrência. 3. A proteção de denominações ou de nomes civis encontra-se prevista como tópico da legislação marcária (art. 65, V e XII, da Lei nº 5.772/71), pelo que o exame de eventual colidência não pode ser dirimido exclusivamente com base no critério da anterioridade, subordinando-se, ao revés, em atenção à interpretação sistemática, aos preceitos legais condizentes à reprodução ou imitação de marcas, é dizer, aos arts. 59 e 65, XVII, da Lei nº 5.772/71, consagradores do princípio da especificidade. Precedentes. 4. Disso decorre que, para a aferição de eventual colidência entre denominação e marca, não se pode restringir-se à análise do critério da anterioridade, mas deve também se levar em consideração os dois princípios básicos do direito marcário nacional: (i) o princípio da territorialidade, ligado ao âmbito geográfico de proteção; e (ii) o princípio da especificidade, segundo o qual a proteção da marca, salvo quando declarada pelo INPI de "alto renome" (ou "notória", segundo o art. 67 da Lei 5.772/71), está diretamente vinculada ao tipo de produto ou serviço, como corolário da necessidade de se evitar erro, dúvida ou confusão entre os usuários. 5.  Atualmente a proteção ao nome comercial se circunscreve à unidade federativa de jurisdição da Junta Comercial em que registrados os atos constitutivos da empresa, podendo ser estendida a todo território nacional se for feito pedido complementar de arquivamento nas demais Juntas Comerciais. Precedentes. 6. A interpretação do art. 124, V, da LPI que melhor compatibiliza os institutos da marca e do nome comercial é no sentido de que, para que a reprodução ou imitação de elemento característico ou diferenciado de nome empresarial de terceiros constitua óbice ao registro de marca - que possui proteção nacional -, necessário, nessa ordem: (i) que a proteção ao nome empresarial não goze somente de tutela restrita a alguns Estados, mas detenha a exclusividade sobre o uso do nome em todo o território nacional e (ii) que a reprodução ou imitação seja "suscetível de causar confusão ou associação com estes sinais distintivos". Não sendo essa, incontestavelmente, a hipótese dos autos, possível a convivência entre o nome empresarial e a marca, cuja colidência foi suscitada.
Conforme a decisão da 3º turma do STJ é possível a coexistência de nome empresarial e marca com elementos característicos semelhantes que atuem no mesmo ramo de atividade econômica, desde que o nome empresarial não goze de proteção legal em todo o território nacional mediante registro em todas as unidades federadas e que a coincidência dos elementos característicos não seja suscetível de causar confusão entre o nome empresarial e marca.
A decisão do Superior Tribunal de Justiça é contrária ao quem vem entendendo a jurisprudência pátria, que normalmente tem prestigiado a marca, em desfavor do nome empresarial, ainda que este tenha sido registrado anteriormente àquela.
REFERENCIAS.
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial, vol. 1: Direito de Empresa. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
STJ, REsp 1204488/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 02/03/2011.
RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Curso de Direito Empresarial: o novo regime jurídico-empresarial brasileiro. 4 ed. Revista, ampliada e atualizada. Salvador: JusPodim, 2010.

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